O vento bate e os cata-ventos coloridos giram todos para o mesmo lado.
O vento continua a bater e leva as bolhinhas de sabão que Moraes assopra no brinquedo de plástico. São poucos os que passam sem olhar. Por ali, a vida parece simples.
– Sou livre igual passarinho. A liberdade me dá saúde, sabedoria, inteligência. A vida é tudo de bom que você pratica.
Benedito Antônio de Moraes, 64 anos, conta que conheceu mais de 20 estados brasileiros vendendo os brinquedos que o vento leva.
Alagoas, Ceará, Paraíba, Recife, Pernambuco, Pará, Maranhão, Goiás, Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Tocantins, Porto Alegre, São Paulo: perde as contas.
– A maior escola da vida é a rua. Aqui, você aprende o bom e o ruim e pratica o que achar melhor.
Descobriu cedo.
Aos 12 anos, para ajudar a mãe viúva a pôr comida na casa onde moravam seus dois irmãos, saia pelas ruas vendendo carnê de prêmios.
Aos 16, começou a viajar para vender bijuterias e pouco depois encontrou o ramo que não mais trocou.
Os cata-ventos nunca deixaram o estoque.
– Eu vendo brinquedos porque sou uma eterna criança. Eu brinco com as crianças, dou risada. A gente tem que levar a vida na brincadeira…
O carrinho onde Moraes pendura os brinquedos e sai a vender é totalmente desmontável. Ele criou e um amigo executou. Quando dá vontade, desdobra, faz as malas e parte para outro lugar.
O porto é Ribeirão Preto. Mas garante que as velas não ficam muito tempo ancoradas. Tem sempre um vento a bater…
– Semana retrasada eu estava em Poços de Caldas e já tô com a passagem comprada para Porto Alegre.
Nessas andanças, casou três vezes (e separou em todas elas), tem nove filhos, 22 netos e três bisnetos que se espalham entre Goiânia, Minas Gerais e São Paulo.
– Vou visitar, levo a mercadoria, trabalho por lá e depois volto.
Só sossega – em partes – quando chega dezembro.
A barba, os cabelos brancos e o carrinho de brinquedos trouxeram o apelido de Noel e não demorou a receber propostas de empresas.
Há seis anos, no Natal, ele troca os cata-ventos pelas balas e brinquedos encomendados – e faz um pé de meia para o ano todo.
Só não gosta de Shopping. Prefere andar por aí, fazer a chegada do Papai Noel de cidade e cidade e ir embora – como era de se imaginar!
O plano para amanhã é continuar trabalhando como foi hoje, e assim até quando se sentir bem.
– Tenho certeza que minha velhice vai ser muito feliz.
Em Ribeirão, Moraes vive sozinho, e comemora.
– Me dou muito bem com a minha solidão. Ouço música, medito, agradeço a Deus. A gratidão é fundamental na vida do ser humano.
Acredita no seu Deus, que é “benevolente” e “não precisa de dinheiro”. Dinheiro, aliás, não é tema central da conversa – e da vida.
– Com o que eu ganho dá para sobreviver e ajudar quem precisa.
Não deixa de brincar com uma só criança – e mãe – que passa a observar os cata-ventos.
– Leva para ela, mamãe!
Moraes desce a rua empurrando seu carrinho de cata-ventos, que continuam a girar. A vida parece simples. E, por ali, não falta vento.
– Não tem como eu reclamar da vida. Com amor, a gente vence qualquer obstáculo.
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