Há 44 anos fazendo o que ama, professora Heloisa é homenageada na Feira do Livro

21 maio 2018 | Gente que inspira

Clique no play:

Esta história foi narrada pelos integrantes do projeto Doadores de Voz, dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unaerp.

Há 44 anos, Heloisa faz o que ama. E não é só ela quem diz, mas os projetos que ganham asas e contagiam Ribeirão Preto.

Combinar palavras, pintar poesias, cantar a vida, preencher a escola com arte: eis o seu dia a dia letivo.

Com ela, o estereótipo do adolescente desinteressado, que não gosta de ler, cai do penhasco. Pablo Neruda, Manoel de Barros, Graciliano Ramos, Machado de Assis, Vinicius de Moraes: nomes que se tornam queridos pelos alunos que convivem com Heloísa.

– Toda arte é transformadora. Nós teremos um mundo muito melhor quando todos abraçarem essa experiência maravilhosa que é a capacidade de sentir e ser arte.

Aos 65 anos, conta que a aposentadoria durou quatro meses. Sentiu os dias perderem o rumo longe da sala de aula. E voltou para a primeira escola onde lecionou, berço do seu projeto Combinando Palavras, que já soma 12 anos de estrada.

Todos os dias, às 7h, Heloísa Martins Alves está pelos corredores da Otoniel Mota, de onde não pretende sair tão logo.

– Eu quero estar aqui. Quero aprender muito ainda. E tenho muito o que aprender.

No tempo vago, coloca suas próprias emoções em palavras, que já renderam três livros.

É a professora homenageada da 18ª Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto. E divide o título com as companheiras de sala.

– É uma alegria muito grande. Mas eu compartilho com todos os professores, que são merecedores. A educação vale a pena. É uma saída.

Heloísa Martins Alves professora Ribeirão Preto

Heloisa nasceu em Ribeirão Preto, filha de pai comerciante e mãe funcionária pública.

O amor pela leitura foi herança de família.

O pai, apaixonado por mitologia, lia muito e compartilhava as histórias com os filhos.

O avô, conhecedor da Bíblia, explicava o mundo em parábolas aos netos. E a tia avó era quem, todos as noites antes de dormir, contava à menina uma história encantada.

Quando chegou o momento de prestar vestibular, ela se sentiu confusa.

Os amigos estavam seguindo para Medicina, mas era preciso tentar o curso fora de Ribeirão. Aos 17 anos, os pais entenderam que ela era muito moça para sair de casa, naquela conhecida história de “escrever certo em linhas tortas”.

– Fui fazer Letras. E foi a melhor coisa da minha vida. Entendi que era aquilo, realmente, que daria certo comigo.

A primeira escola onde entrou como professora de Língua Portuguesa e Literatura foi a Otoniel Mota, no Centro de Ribeirão Preto. Tinha por volta de 21 anos, recém-formada, e substituía aulas.

Quando passou no concurso do Estado de São Paulo, assumiu vagas em Itaquera, zona Leste da Capital.

– Eu levava três horas para ir e três para voltar. E tinha medo, porque pegava o ônibus sozinha tarde da noite.

Foi transferida, então, para a Secretaria de Cultura de São Paulo, onde atuou por cinco anos, antes de seguir para a Secretaria de Esportes e Turismo, desenvolvendo projetos educacionais com alunos de escolas públicas.

Voltou para Ribeirão Preto no início da década de 90. E acredita que passou por todas – ou quase todas – as escolas da cidade.

A aposentadoria veio em abril de 2006, como professora da escola Cônego Barros.

– Eu fiquei nervosa. Cheguei em casa e não tinha o que fazer.

Em agosto, voltou para a sala de aula, na Otoniel Mota, onde tudo começara décadas atrás.

Sua principal função é desenvolver projetos. E não perde tempo.

O Combinando Palavras completa 12 anos de estrada e a Incubadora Cultural existe há sete: projetos que contaram com a sua criatividade para nascer.

Os dois têm o mesmo objetivo de incentivar a leitura, aproximando os alunos das palavras com arte e liberdade.

Durante 10 anos, o Combinando Palavras foi realizado com estudantes da Otoniel Mota. Desde 2017, o projeto passou a fazer parte da Feira do Livro de Ribeirão e, a professora diz, se estende para mais de mil alunos, de todas as escolas estaduais da cidade.

Os adolescentes estudam autores ao longo do ano e desenvolvem atividades a partir de suas obras. Escrevem poemas, fazem desenhos e fotografias que, ao final, são transformados em livros. Na feira, eles têm a oportunidade de estar com muitos dos autores que estudaram.

– O autor é a inspiração. O texto é do aluno. É o que o aluno sente sobre aquela obra. A gente fica emocionado com o que eles têm dentro. Mas, se não mostrarmos, eles mesmos não acreditam.

Heloísa Martins Alves professora Ribeirão Preto

Heloisa acredita na união de arte e educação como forma de transformar as pessoas.

– A arte faz sonhar. Nos leva para outros mundos. Caminhos que só a imaginação consegue levar. Com os pés no chão, não é possível alcançar. É a arte que nos leva embora.

O professor não é, na sua opinião, o centro da sala de aula.

– É uma troca. Ninguém é dono da verdade. A meta é o aluno. Ele é a estrela. Como professora, eu estou ali para ajudá-lo a brilhar bastante.

Quer estar no mundo do estudante, entendê-lo. Tanto que criou até trabalho para estudar as gírias que os jovens falam.

– A gente tem que tentar acompanhar o aluno, para não ficar fora do tempo. O jovem de hoje é o jovem que sempre existiu, mas vivendo outra época: cheio de vontade de conhecer, de descobrir. Ele só está perdido entre tanta tecnologia. Precisa de orientação para se encontrar.

Para ela, levar a leitura aos jovens é como costurar asas em suas costas.

– A leitura leva para muitos mundos diferentes. Um só livro tem muitas leituras diferentes. Cada um faz a sua.

Entende o ensinar como ato de amor.

– O aluno tem que se sentir acolhido, para que ele possa se abrir. Cada aluno é um universo. E respeitar o universo de cada um é o mais importante.

Uma aluna entra na biblioteca onde a entrevista acontecia e vai logo dizendo para Heloisa:

– Professora, volta a dar aula para mim? Marca a minha turma, para não se esquecer.

O rosto da professora se ilumina em sorriso. Mesmo assim, ela ressalta para a jovem que a professora que está lhe dando as aulas é uma ótima profissional.

– O que me move? É a vida, o amor. Se eu parar aqui, vou trabalhar com outro projeto cultural. Trabalhar com jovem faz a gente se sentir jovem. Quando eu entro na escola, deixo tudo para trás. Eu fico muito feliz de estar aqui.

Há 44 anos, Heloisa ama o que faz.

Compartilhe esta história

2 Comentários

  1. Maris Ester A.Souza

    Parabéns Daniela pela matéria. A Heloísa ama o que faz e quem coloca amor no que faz colhe em abundância.

  2. Silvia

    Heloísa é de uma dedicação, carinho e respeito aos alunos , como poucas pessoas q conheço.
    Ela é incansável. Graças a ela , muitos alunos , desenvolveram seus dons e acharam seus caminhos .

Outras histórias