Esta história foi contada pela primeira vez em 28 de abril de 2017.
O Charles menino era tímido e acuado. Quem vê o Charles adulto no palco, tocando e cantando à frente da Banda Marista Filhos da Pauta, custa a acreditar.
– Toda história tem um porquê. A música é a minha história, o meu porquê.
Charles Calil Berbari, 55 anos, se descobriu músico e tomou gosto pela vida. A Banda Marcial do Colégio Marista, uma das mais tradicionais de São Paulo na década de 70, foi o estopim desse amor que durou a vida toda.
– Quando eu cheguei no Marista, com 13, 14 anos, eu era tímido, obeso e tinha uma grande tendência a ficar escondido.
Charles estudava em escola pública. Diz que a partir da década de 70 a qualidade do ensino começou a cair, porém, e seus pais decidiram matriculá-lo no Marista, uma das poucas escolas particulares de Ribeirão Preto na época.
– A coqueluche da escola era a banda. Todo pai tinha o sonho de ver seu filho na banda.
Quando foi convidado a participar, assim, a família aceitou com festa. A determinação – dos pais e da escola – era que as notas e o desempenho em sala de aula não caíssem. Essa era a regra para participar da banda, que chegou a ter 80 participantes.
Charles entrou na banda tocando caixas, instrumento de percussão. Conta que depois de alguns anos começaram a faltar trombonistas no conjunto e ele foi convidado a aprender.
– O trombone foi o meu instrumento de identificação. A partir daí, passei a viver a música dentro de mim.
Tanto que, em alguns meses, era destaque na banda, puxando a carreata.
A nostalgia faz parte da fala de Charles. Conta dos tempos de Marista em detalhes. Poderia passar dias relembrando.
– Era um mundo mágico. O nosso maior prazer era, no começo do mês, olhar na lousa o calendário de apresentações.
A Banda Marcial Marista, ele conta orgulhoso, era uma das mais fortes do estado. Chegou a ter 80 participantes, sendo 40 músicos só no time de sopros e metais.
Era formada só por homens. As mulheres vinham à frente, como balizas. Determinações da época.
O grupo viajou o Brasil todo para se apresentar e participar de competições.
– Conheci o sul de Minas, Paraná, Paraguai… viajamos dias de ônibus para chegar ao Paraguai, fazendo pontes em colégios Maristas. Foi uma festa!
A banda ficou ainda mais famosa por fazer “evoluções” junto com as músicas. Enquanto tocavam, os alunos iam se movimentando e formando figuras geométricas.
– O estádio vinha abaixo! Era indescritível!
A banda marcial durou até o começo da década de 80, para a tristeza de Charles e de outros tantos alunos.
Um problema interno fez com que a música que contagiava chegasse ao fim.
– Nós fomos para outra escola, mas não teve jeito… acabou.
Charles, que a essa altura já pulsava pelo seu trombone, não podia parar. Alguns anos antes, havia começado a fazer bailes de Carnaval com outros alunos da banda.
Conta que a festa era na avenida Nove de Julho, e juntava multidões.
Quando a banda marcial, de fato, acabou, a banda Filhos da Pauta surgiu, formada por ex integrantes do grupo de colégio.
– A gente era chamado para tocar com outras bandas. Mas, com 17, 18 anos, eu quis ter a nossa banda. Com 18 anos, vendi meu primeiro Carnaval.
Charles diz que, entre altos e baixos, no ano que vem completa 40 anos de Carnaval ininterruptos.
Com o tempo, a formação original foi se desfazendo. Mas o trombonista continuou à frente, com seu sopro.
Charles não viveu só de música, porque tinha contas a pagar.
– Quem exerce atividade musical ou cultural no país só o faz por amor. Não há como almejar nada. A arte não tem apoio.
Se formou em Biomedicina, fez Administração de Empresas e trabalhou na área de finanças. A música, volta a afirmar, é a trilha sonora da vida.
– A música me fez sair para enfrentar o mundo. É toda minha estrutura e alicerce.
Agora, aos 55 anos, decidiu se dedicar exclusivamente ao que ama. Cheio de planos, ideias e nostalgia.
Em 2012, o Marista reuniu a banda marcial de outrora para comemorar 50 anos de colégio. Os ensaios começaram meses antes. Mais de 80 se apresentaram.
Charles foi destaque, com seu trombone inseparável.
A alegria de tocar foi tão grande que o grupo não quis mais se separar. A Banda Marista Filhos da Pauta voltou à formação original, com planos de crescimento.
Charles pretende transformar o conjunto em Big Band ainda esse ano. Neste Carnaval, a agenda esteve lotada. Como no passado, a banda voltou a animar as festas com sambas e marchas tradicionais.
Para Charles, a retomada do que não deveria ter acabado.
– A minha história musical é ligada a banda marcial. Ali comecei e ali estou de volta.
A música embala sua vida.
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