Texto: Daniela Penha – Fotos: Sheila Brandão – Ilustração: Cordeiro de Sá- Produção: Vandreza Freiria
Antes da pandemia começar, quando os contatos eram mais que bem-vindos, Dr. Laurence lotou um ônibus de crianças e famílias para uma tarde de passeios. Reservou seu próprio acento. Foi com a turma, participando de cada detalhe.
Conhece cada um dos seus pequenos pacientes, faz questão de estar em contato com as famílias. Alegria e afeto, ele acredita, ajudam as crianças em tratamento contra o câncer tanto quanto os medicamentos.
– Muitos deles nunca tinham ido ao parque. Eles precisam tirar o foco da doença, perder o foco da tristeza. A criança não pode lembrar dessa fase da vida dela só com coisas tristes. A tristeza dificulta tudo, até a eficácia do tratamento.
Saíram de Franca, foram ao Zoo Municipal de Ribeirão e depois a um parque de diversões. Aos pais, o médico diz, a alegria traz energias para seguir acreditando.
– O tratamento dói mais é no pai e na mãe. A criança tem a dor da picada, mas não entende muito. O pai e a mãe queriam tanto que fosse neles e não nos filhos…
A Medicina do Dr. Laurence é feita de remédios, dados e pesquisas, claro. Mas também conta com afeto, diálogo e muita entrega. Poltronas coloridas, óculos 3D para as crianças assistirem desenhos enquanto passam pela quimioterapia, treinamento da equipe que começa lá na portaria e segue até o corpo clínico, serviço de capelania: ele procura estratégias para deixar mais leve e colorido o branco hospitalar, o enfrentamento das doenças.
– O acolhimento começa no guarda que faz a triagem na porta. Nós somos insistentes para que esse pensamento seja o de todos os colaboradores.
Como diretor técnico do Hospital do Câncer de Franca, do Hospital do Coração e da ala Covid, instituições interligadas à Santa Casa da cidade, ele busca levar a humanização para as atividades diárias, praticando e compartilhando a Medicina na qual acredita.
– É muito mais do que números. É a história de cada um. Como passaram por tudo isso e o que vão levar? Precisamos criar grandes histórias ali dentro.
Desafios de todo dia
Laurence Dias de Oliveira, 39 anos, não se lembra quando decidiu ser médico. A ideia lhe acompanha há tanto tempo que parece parte sua.
– Eu não me lembro de não querer ser médico. Meus pais falam que desde pequeno eu falava nisso. Sempre fui muito apegado aos meus avós. O cuidar fica mais aflorado.
Nasceu em Franca, em 25 de agosto de 1981, e brinca:
– É o Dia do Soldado. Venho trabalhando como soldado da vida, nas batalhas do dia a dia.
Não havia outros médicos na família. Sua mãe foi professora e o pai caminhoneiro. Por isso acredita que a ideia do cuidar já estava dentro de si.
Fez faculdade em Vassouras, Rio de Janeiro. Depois, cursou a residência em ortopedia em Ribeirão Preto. Em Campinas, se especializou em cirurgia de mão.
Conheceu sua esposa, que é médica ginecologista, neste percurso. Os dois voltaram a viver em Franca para trabalhar na Santa Casa em 2011. Desde que chegou, atuava com os residentes de ortopedia.
Em novembro de 2019, assumiu a diretoria técnica. Cinco meses depois, os casos de Covid explodiram no Brasil. O hospital abrange uma área de 700 mil habitantes. Abriram uma ala para atendimentos de coronavírus com 53 leitos, destinados ao SUS.
Somente nos últimos meses a ocupação começou a cair.
– Eu nunca havia vivenciado tanta pressão emocional. A gente tentava ajudar o maior número de pessoas possível, sem condições técnicas, físicas. Batalhando para que os pacientes do SUS tenham o mesmo acesso do que pacientes do sistema particular. É sempre um dia após o outro…
Pandemia com acolhimento
Até em meio a tanta turbulência, encontrou um jeito de acolher. A regra era colocar pacientes da mesma família no mesmo quarto, para que continuassem em contato. Depois, quando a situação melhorou um pouco, abriu a UTI Covid para visitas.
– O sofrimento de ficar mais de 10 dias sem ver a família é muito grande… Nós tentamos amenizar isso.
A entrega é total. Não consegue tirar o jaleco na porta e se despir dos problemas quando chega em casa. As filhas, então, acompanham a jornada dos pais.
– Elas veem com bons olhos o cuidar. Hoje já entendem mais.
As pequenas têm 6 e 3 aninhos.
– Com a pandemia, elas queriam dar um abraço quando a gente chegava em casa. E não podíamos deixar. Foi muito difícil.
Assim que iniciou seu trabalho no Hospital do Câncer, com crianças em tratamento, o pensamento vagava para casa.
– Quando você começa a trabalhar com câncer, descobre um outro lado, mais humano. É algo que nos cativa… Eu tenho filhas pequenas. Como não pensar nelas?
Carrega, então, todo esse olhar na maleta de médico.
– A pessoa mais importante do hospital é o paciente. Sem o paciente, não existe hospital. Ele precisa ser o centro das atenções.
Hospital mais colorido
Nesses dois anos como diretor técnico, mesmo em meio à pandemia, ele conseguiu deixar o hospital mais colorido. Não só com poltronas e reformas, mas com altas doses de afeto.
A lista de pequenas grandes ações é grande: passeios, dias especiais em datas comemorativas, brinquedoteca, formas diárias de levar alegria a um cenário de tristeza.
Implantou o serviço de capelania, destinado principalmente aos pacientes do setor paliativo.
– Cada pessoa precisa ter sua crença e se apegar a alguma coisa, independentemente de religião. É trazer dignidade para que eles passem por esse momento acolhidos, amenizando suas dores.
Esse é, afinal, o grande objetivo.
Festa Junina, Páscoa, Dias das Crianças: nada mais pode passar em paredes brancas.
– A criança precisa crescer como criança. Acreditar, fantasiar. Nós tentamos resgatar isso.
No Natal, sua família também entrou na brincadeira (que, na verdade, é bem séria). A esposa criou uma campanha e arrecadaram brinquedos para a criançada. Não só para a oncologia, mas também para outros setores do hospital.
– Eu tenho que envolver toda a minha família, senão fica muito pesado. As meninas vão crescer sabendo da necessidade de ajudar ao próximo.
Para que tudo seja possível, busca parceiros. O parque de diversões, indústria de doces, agência de turismo. A cada ideia que surge, pensa em formas de transformar em prática com união de forças. O Mesa Brasil é um dos parceiros. Os alimentos doados chegam para os mais diversos setores do hospital, para pacientes e também funcionários.
Desde que foi cadastrada no programa, em fevereiro de 2021, a Santa Casa já recebeu quatro doações, somando 1,5 toneladas de alimentos.
– Uma alimentação equilibrada traz qualidade de vida e faz parte do tratamento. Para que dar vitaminas se eu posso oferecer um alimento rico em vitaminas? As doações nos ajudam nisso.
O grande objetivo de tantas ações, parcerias e ideias é dissolver a dor entre momentos de alegria. Dar ao paciente mais do que a tristeza que, por si só, a doença já causa.
– Ser médico é tentar se colocar no lugar das pessoas. Pensar: O que elas estão esperando? Será que é só uma receita? Ou o cuidar, o escutar? Ter empatia é tentar diminuir ao máximo o sofrimento das pessoas.
Pressa de alegria
Com tanto coração, ele não se acostuma com a rotina, que é feita de perdas.
– Ninguém se acostuma a perder um paciente. Não é fácil.
Coloca os ganhos na frente, entretanto, e vai seguindo.
– A gente tenta fazer com que seja o menos dolorido possível. A vida precisa seguir. Outra criança precisa do seu carinho. Tem alguém te olhando lá cima, te dando forças para passar por tudo isso.
No consultório, a empatia entra primeiro.
– Tem dias ruins, mas a pessoa não tem culpa disso. Muitas vezes ela esperou meses para estar aqui. Nós temos que, todo dia, saber o poder da nossa caneta.
No dia da entrevista, Dr. Laurence estava animado com mais uma ideia.
– Já pensou se cada poltrona de quimioterapia tivesse uma pequena tela ou tablete com fone de ouvido para o paciente assistir um programa, ver alguma coisa enquanto passa pelo tratamento? Seria uma boa, né? Hoje de manhã pensei nisso!
Já estava traçando estratégias e pensando em possíveis parceiros para tirar a ideia do papel. Pensava no quanto a ideia iria amenizar o momento das picadas e da medicação. E deixava a animação tomar conta.
– A gente está sempre pensando no próximo projeto. Não pode parar.
Quem vive a dor tem pressa por alegria, ele bem sabe.
Conheça mais sobre o Mesa Brasil
Que tal criarmos uma ponte entre quem precisa de ajuda para matar a fome e quem pode e quer fazer o bem? Uma ponte que consiga unir essas duas pontas, fazendo com que os alimentos que sobram para um cheguem à mesa do outro?
É isso que faz o programa Mesa Brasil, criado pelo SESC SP há 27 anos e presente em todo o país.
Caminhões coletam diariamente doações de alimentos com empresas, supermercados, cerealistas, produtores, entre outros fornecedores e entregam para instituições sociais e hospitais. Só em São Paulo são 30 caminhões circulando todos os dias para atender 63 cidades paulistas.
Realizando a coleta e a entrega dos produtos, o Sesc São Paulo facilita o caminho para quem quer doar e garante que toneladas de alimentos que seriam desperdiçados cheguem à mesa de quem precisa: uma rede de combate à fome!
Em tempos de pandemia, o programa se tornou ainda mais fundamental. Só em 2020 foram distribuídos mais de 7.200.000 kg de alimentos, além de 470.000 kg de produtos de higiene e limpeza para 1.150 instituições sociais e 120.000 famílias. Em 2021, já são 2.425.809 kg de alimentos arrecadados.
Em Ribeirão Preto, o programa existe desde 2014. Dois caminhões passam pelas empresas doadoras pela manhã, para coletar os alimentos doados, e, no período da tarde, levam o que foi coletado para as instituições sociais. Em 2020, o programa coletou 220 toneladas de alimentos e materiais de limpeza e higiene. Atualmente, está com 87 instituições sociais cadastradas e mais de 3000 famílias atendidas.
O Mesa Brasil do SESC Ribeirão atende, além de Ribeirão, as cidades de Serrana, Sertãozinho, Santa Rosa do Viterbo, Guariba, Jaboticabal, Franca e Barretos. De janeiro até agosto de 2021 já coletou 132 toneladas de alimentos. E os números não param de crescer – ainda bem!
O projeto “Gente que Alimenta” conta as histórias de quem faz esse programa do bem acontecer: doadores e instituições que precisam de apoio para continuarem suas atividades.
Quer saber mais sobre o Mesa Brasil? Quer se tornar um doador? Acesse o SITE AQUI e se encante ainda mais com esse bonito programa!
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