O Mercadão de Ribeirão Preto tem 116 anos de história. Antônio Ventrice faz parte de 54 deles. Vai além das Bodas de Ouro com o marco da área central.
Tem na ponta da língua a data do primeiro dia de trabalho entre as bancas que, naquela época, eram quase todas de hortifrúti e granjeiro.
Os vendedores amarravam cabritas vivas na porta do mercado esperando um comprador. Os galos e as galinhas também eram expostos cacarejando, antes de virar carne para a panela. A mercadoria chegava de carroça, vinda das fazendas da região. A estrutura era toda improvisada, mas o movimento fazia os comerciantes rirem de ponta a ponta.
São as lembranças de Toninho, como é conhecido.
Em 28 de outubro de 1962, aos 12 anos, ele teve seu primeiro dia de trabalho ali. Hoje, aos 65, é dono de uma tabacaria e chapelaria, trabalhando com os filhos e torcendo para os netos também pegarem gosto pelo legado.
– O Mercadão? É minha vida toda. Toda minha vida dedicada aqui.
Depois meio século e um pouco mais de trabalho, a história de Toninho mistura-se a do Mercadão e não há como negar: o foco é o vai e vem diário de gente e as transformações daquele lugar.
Aos sete anos, começou a trabalhar na roça, como era de costume na época. Quando fez 12, o pai decidiu aumentar sua função. Comprou um facão para o menino aprender a cortar cana.
A irmã mais velha, porém, decidiu intervir. Ela trabalhava na padaria que fornecia os pães vendidos no Mercadão e soube que no bar-restaurante precisavam de alguém para lavar os pratos.
– Eu deixei de ir cortar cana. Trabalhava lavando prato de dia e podia estudar a noite. Agradeço a minha irmã! Poderia ter sido muito diferente…
Dos pratos, passou a atender o balcão, depois as mesas e foi convidado por outro comerciante para vender fumo. Passados 16 anos trabalhando para o dono, montou sua própria loja em sociedade com um amigo do trabalho.
A parceira durou até 2000, quando cada um montou sua loja, no mesmo corredor do mercado central.
Toninho é documento. Relembra cada fase e mudança pela qual o mercado passou. Conta que até a década de 90 o movimento era alto porque não havia tantos supermercados e shoppings na cidade.
A partir daí, porém, o fluxo de compradores começou a diminuir porque as pessoas tinham outros lugares para comprar frutas, verduras, legumes, peixes e carnes: principal mercadoria vendida na época.
Foi em 2000, nos relatos de Toninho, que os corredores voltaram a ser movimentados.
– Com o mercadão de São Paulo e a reforma que fizeram por lá, as pessoas voltaram a se interessar.
As bancas mudaram. O hortifrúti é minoria e no lugar o Mercadão passou a vender, em maior número, queijos, embutidos, castanhas, bacalhau.
Se encontra de tudo, porém. Ótica, loja de presentes e especializada na cultura japonesa, Pet Shop, calçados: difícil é ficar sem o que procura.
Na loja de Toninho, o forte é fumo de corda, mas os chapéus de todo tipo de multiplicam pelas paredes, assim como chaveiros, cintos, cachimbos.
– Antigamente, quem consumia fumo de corda era quem morava na roça. Hoje, é quem mora na cidade.
Assim como a loja está na segunda geração, Toninho conta, todo sorridente, que tem clientes netos de antigos compradores.
– As pessoas gostam de comprar no Mercadão pelo contato humano. Aqui se conversa, se experimenta o que vai levar.
Depois que completou 60 anos, tirou o pé do acelerador, passou a chegar no mercado às 11h – antes era às 7h – e a deixar mais as responsabilidades nas mãos dos filhos.
Agora, se prepara para aposentar – mas só aos 70.
– Vou aproveitar um pouco… passear, viajar.
E sem saber se vai mesmo conseguir.
– Trabalhar nunca foi difícil para mim…
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Que história linda! Toninho (Nicão), embora eu o conheça e tenha sido professora dos seus filhos, eu não conhecia sua linda história de vida! Essa homenagem foi muito merecida, parabéns!
Parabéns pela homenagem Nicão. Você merece…