No bairro Campos Elíseos, difícil é encontrar quem não saiba onde mora o “velho Nascimento”. Há 30 anos a escola de samba – e seu fundador – ganharam sede própria. Nascimento criou os filhos na quadra grafitada da rua Ribeirão Preto. Improvisou seu lar ali, entre os ensaios, os troféus, as fantasias, o samba que nunca para.
Não haveria lugar melhor. Luiz Carlos do Nascimento, 74 anos, é Carnaval: no lar, no passado, no coração. Uma vida de samba no pé e luta pela manifestação cultural que, ele defende, leva vida à comunidade.
Quando fundou a escola Embaixadores dos Campos Elíseos, em 1967, aos 24 anos, já tinha uma história de passarela.
– Eu tinha seis anos de idade. Fui ver o ensaio da escola “Os Bambas” e me apaixonei.
Nascimento caiu no samba e encantou a escola. O convite para desfilar foi imediato. Passou a integrar a primeira escola de Ribeirão Preto e uma das primeiras do Brasil.
– Eu não choro de lembrar do meu passado, filha. Chora quem não tem história. Eu tenho história. Minha vida não foi em vão.
Aos oito anos, Nascimento aprendeu a trabalhar de ferreiro para ajudar em casa. A mãe cuidava sozinha de dois filhos, lavando e passando roupa. Aos 14, Nascimento foi para sacaria. Aos 20, passou para eletricista, ofício que levou por toda vida.
– Eu trabalhei bastante, filha.
Para quem descobriu cedo o peso do batente, colocar uma escola na rua não parecia tão grande desafio.
Nascimento conta que fundou a Embaixadores sem qualquer apoio financeiro. Os primeiros desfiles eram feitos pelo que ele chama “livro de ouro”.
– A gente saia pedindo ajuda. Quem podia dava cinco, quem não podia dava dois. Era mais um bloco. A partir de 80 foi que o Carnaval ganhou força.
Escolheu como cor da escola o azul e rosa, para unir Portela com Mangueira.
Em 1987, a escola ganhou a quadra como sede. Foi a primeira de Ribeirão Preto a ter sede própria. Nascimento conta, porém, que o terreno era mureta e piso.
– A gente reunia os componentes da escola e trabalhava todo sábado e domingo. Levantamos a quadra!
Em 1970, a Embaixadores dos Campos Elíseos foi campeã do Carnaval de Ribeirão Preto pela primeira vez: a melhor lembrança de Nascimento. Depois desse, ele diz, vieram outros 39 títulos, 20 deles oficiais.
– O Carnaval faz muita gente chorar pela agremiação. E mais ainda no dia de abrir as urnas. Eu só tive choro de alegria.
Choro que transformou em frutos. A Embaixadores é Associação Comunitária e Cultural. Nascimento mostra – sorridente – o relatório de atividades do ano passado. Aula de capoeira, almoços, reuniões culturais, festas para a comunidade no Natal, Páscoa, Dia das Crianças.
– Isso aqui não para. É para a comunidade.
Há dois anos, Nascimento perdeu uma das pernas, amputada pela diabetes. Continuou o trabalho, com a firmeza de sempre.
– Se Deus quis assim, eu não vou brigar.
Por falta de apoio da prefeitura, há quatro anos a Embaixadores não desfila. Para não morrer, o Carnaval é feito na quadra, com samba abafado pela falta de apoio.
Nos meses que antecediam o Carnaval, o espaço fervilhava de gente. Todo dia, tinha equipe trabalhando, ensaiando, sambando. Nascimento diz que eram distribuídas 120 refeições diárias para matar a fome de tanto sambista.
Hoje, é vazio. Quadra sem gente, sem samba, sem cor. Nas semanas finais, organizam um ou outro ensaio para o Carnaval limitado pelos muros da sede.
Escola de samba gosta mesmo é da rua. E Nascimento garante que em 2018, com apoio ou sem, vai colocar a Embaixadores para desfilar.
– Era para ser esse ano, mas não deu. A crise veio e aí já viu.
Do próximo ano não passa, ele dá sua palavra de sambista.
– Quero estar à frente da minha escola de samba, principalmente à frente da minha bateria. Na cadeira de rodas, com prótese, nem que seja pela última vez. Aí, posso morrer feliz.
Quer morrer sambando, vestido de azul e rosa.
Que força e vitalidade o mestre tem. Ele é reverenciado por sua excelência no samba. Minha admiração ao grande mestre Nascimento.