O estúdio foi construído pelo pai e o avô, no quintal de casa.
No dia da primeira transmissão, a cidadezinha que hoje tem 7,4 mil habitantes parou para ouvir.
Juliana conta que a rua da casa recém transformada em estúdio ficou abarrotada de gente querendo conhecer a tal rádio.
Era ela, aos 18 anos, quem tomava conta sozinha da empreitada. Fundou a primeira rádio comunitária de Guatapará.
E quis mais.
Dois anos depois, criou o primeiro jornal impresso que, além de escrever todinho, entregava de porta em porta nas casas dos guataparaenses.
Juliana é do tipo que não economiza palavras e energia.
E, se faltar, repõe com litros diários de café. Para acordar, vem uma xícara de 250 ml.
E o dia está só começando.
Faz caber mil e duas atividades em 24 horas.
Trabalha como jornalista em um site próprio recém lançado, tem uma empresa de eventos de moda e ajuda o marido na administração do café que abriram há quase dois anos no Centro de Ribeirão Preto, realizando sonho antigo.
Juliana Rangel tem o coração dividido entre café, jornalismo e moda.
E, se for o caso, arruma espaço para o que mais a vida trouxer.
Lá em Guatapará, levando informação para a casa das pessoas à base de vontade, ela criou o lema que repete ainda hoje, aos 37 anos:
– Eu transporto toda a vontade de realização para os meus sonhos. E vou atrás. Nunca tive medo e nem vergonha de buscar. E ver o resultado não tem preço!
Café
O cheirinho de café passado na hora avisa que a conversa pode começar.
Com a Ju, um bom papo tem que vir acompanhado de um bom cafezinho.
O grão, afinal, também é parte da sua história.
Está em todas as fases, bem antes de virar sonho realizado.
Ela conta que na fazenda onde morava quando criança o cafezal era diversão. Corria entre os pés de café e sobre os grãos colocados para secar.
– A família toda sempre teve o costume de fazer todo o processo do café: plantar, colher, torrar, moer. Passar o café no coador de pano, com mariquinha…
No café que abriu no Centro de Ribeirão, manteve a tradição da infância.
A avó faz os coadores de pano e o avô que fez a mariquinha de madeira. Tem expresso, mas também tem cafezinho de fazenda no cardápio.
O local, aliás, é todo feito de história. Nas paredes, as fotos da Ribeirão feita de café relembram o passado.
O nome, BeSô, tem história do presente, com a soma das iniciais dos filhos de Juliana e de seu marido, que administra o negócio.
– A gente queria agregar história. A história de Ribeirão está no Centro e no café.
O sonho de abrir a própria cafeteria foi realizado quase dois anos atrás, em plena crise. Ela conta que justamente a recessão trouxe a oportunidade.
O ponto só pôde ser alugado por um preço bom porque estava há meses vazio.
O medo de investir foi grande.
– Desde o dia em que nós assinamos o contrato eu não dormi mais.
Mas estava feito. Não dava para voltar atrás.
E deu tão certo que hoje ela já fala em planos de expansão.
– As pessoas esquecem de olhar para o Centro. Nossa proposta é valorizar.
Com seu próprio café, oferece aquilo que tanta ama. Mas não deixa de provar as delícias servidas Ribeirão e mundo afora.
– Quando você sente o cheio de café, o que pensa? Para mim, é um momento especial, traz coisas boas, proporciona encontros! O dia em que eu não acordo tomando café, me dá dor de cabeça!
Toma tanto que precisou colocar limites. Até às 18h, para garantir algumas horas de sono. E torcendo para a manhã – que traz o cheirinho do grão – chegar logo.
Jornalismo e moda
O jornalismo chegou primeiro. Mas foi por ele que a moda também conquistou espaço. Ju soma as duas paixões em um só pacote.
Quando lançou a rádio em Guatapará, já sabia que queria fazer jornalismo. A faculdade, porém, parecia sonho distante. E a solução foi buscar seu próprio espaço, como já estava acostumada a fazer.
Começou a trabalhar como babá aos 13 anos, para comprar o que o dinheiro apertado da família não permitia.
Aos 14, era vendedora em uma loja de produtos importados e, não contente em vender no horário comercial, levava os produtos para a escola em uma mochila para compor a renda.
Diz que quando decidiu deixar a lojinha, aos 16 anos, para trabalhar como locutora em uma rádio, arrancou lágrimas da dona.
– Eu era a melhor vendedora. Estava sempre pensando em uma coisa nova!
Juliana ficou dois anos como locutora de rádio em Barrinha e Jaboticabal – onde a família morava na época.
Encantada com a profissão, decidiu se mudar para Guatapará – cidade onde nasceu e onde moravam os avós – e fazer a primeira rádio da cidade.
Conta que foi a Brasília brigar pela licença das rádios comunitárias.
Quando a rádio deu certo, decidiu expandir para jornal. Entrevistava, escrevia, imprimia e entregava os jornais quinzenais na porta de cada casa da cidade.
– Eu levava de quatro a cinco horas andando a cidade toda. Mas a minha satisfação era entregar o jornal. Aquilo era o meu trabalho!
A rádio durou de 98 a 2000 e o jornal de 2000 a 2006. Juliana diz que, desde então, Guatapará nunca mais teve qualquer veículo de imprensa.
Vez em quando pensa em reabrir, mas o caminho já deu muitas voltas depois dessa primeira.
Em Ribeirão, ela fez cursos na área de jornalismo até que pudesse financiar a faculdade.
– Eu me formei com 26 anos e passei muito tempo pagando a faculdade. Muita gente olhava para mim e dizia: ‘Ih, essa daí? Veio de cidade pequena e não vai chegar a lugar algum!’. Quem é você para julgar alguém? Tudo que eu conquistei foi com muita batalha!
Trabalhou na Revista Expressão, no Jornal A Tribuna e, por sete anos, no Jornal A Cidade.
Por lá, passou a fazer coluna social e se encantou pela moda.
Há um ano, quase ao mesmo tempo de realizar o sonho do café, abriu uma empresa que organiza eventos do segmento da moda.
Há duas semanas, pediu demissão do Jornal A Cidade para tocar seus negócios, empreender, andar por novos caminhos.
– Hoje eu consegui realizar o sonho de atuar com as minhas três paixões.
Amanhã
– Realizada? Eu consegui conquistar o que sempre sonhei, mas sempre acho que tenho algo a mais para fazer.
Quem conhece a Ju, bem sabe: mesmo um cafezinho com ela é cheio de movimento.
Inquieta, não economiza energia, palavras e sonhos.
– Eu vim de uma cidade com sete mil habitantes, não tinha dinheiro para estudar e hoje consegui alcançar tudo o que eu sempre quis.
Conta que na família era vista por olhares tortos, incomodados com seu jeito de querer tudo ao mesmo tempo. Hoje, dá conselhos para a prima que, como ela, quer ser jornalista.
– Se tem amor, se tem vontade, dá certo. Se não der, eu tentei!
Os planos para o futuro são muitos. Ela diz que, quase todo dia, acorda com uma ideia nova, um novo projeto, uma pimenta no café.
E pretende seguir assim.
Esse cafezinho terminou. Mas ainda tem muito pó para passar – em coador de pano ou na máquina do expresso.
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Amei, texto lindo!
Há eu pude presenciar tudo isso! Que orgulho tenho de você minha amiga! Você inspira muitas pessoas! Já te falei inúmeras vezes e vou repetir, te admiro como profissional, como pessoa, como esposa, como mãe e como amiga! Aquela que a tem como amiga com certeza nunca pode perder! Como se diz o velho ditado essa juliana é pau pra toda obra! Parabéns ju!!!!! Que você cresça e realizes seus sonhos cada dia mais!
História linda! Admiro ainda mais a Juliana depois de ler esse texto! Parabéns pela determinação Juliana!
Daniela parabéns pela leveza do texto, adorei!
Linda história. A Juliana merece, muito simpática e esforçada!!! Ela e toda família estão de parabéns. Parabéns também para Daniela pelo texto tão interessante!!