Com alegria e força, Maria Creunice adoça os dias amargos

8 dezembro 2021 | Destaque, Gente que alimenta, Projetos especiais

 

Texto: Daniela PenhaFotos: Sheila BrandãoIlustração: Cordeiro de Sá- Produção: Vandreza Freiria

Para Maria Creunice, não há dia amargo. Criou os filhos com luta adocicada – e entre boas receitas salgadas também. Antes de entrar na empresa onde há 18 anos fixou morada, fazia roscas, pães, salgadinhos para festas, pães de todo tipo. 

– Criei três filhos batalhando. Não pode deixar o barco afundar. Tem que remar contra a maré e ir em frente. 

Mesmo quando relembra as ondas mais enormes, mantém o sorrisão no rosto. 

– Não adianta cara feia. Não vai resolver em nada. 

Com esse bom astral, se tornou querida e requisitada na Flormel, empresa de doces saudáveis com sede em Franca e distribuição por todo o Brasil, que é uma das doadoras do programa Mesa Brasil na região de Ribeirão Preto. 

Creunice entrou em 2003 para funções gerais: lavava aventais, quebrava coco. Depois, foi somando outros trabalhos, crescendo profissionalmente. 

– Eu fui queimar açúcar. Nessa época, a gente fazia as cocadas com açúcar. Eu estava no céu! 

Hoje, é responsável pela formulação.

– É o coração da empresa! O que eu amo! 

Todos os dias, prepara os ingredientes das receitas e envia para a produção, com cada item já misturado e nas quantidades exatas para a fabricação. Tudo precisa ser pesado e conferido dezenas de vezes. Por dia, chega a preparar 30 receitas. A fábrica produz cerca de 45 toneladas de doces saudáveis ao mês! 

– É muito doce! 

Não sossega, porém. 

– Sou mil utilidades. Quando pensam que eu estou aqui, já estou lá. 

É chamada para ver se o doce está no ponto, ajudar a resolver as mais diversas questões e também provar receitas novas. 

– Se eu gosto, eu falo. Se não gosto, também já falo na hora! Muitas pessoas irão consumir aquela receita do portão para fora. Precisa estar perfeita! 

Creu, Cleu, Creunice: os apelidos são muitos, como o carinho que ela conquistou ao longo dos anos por ali. 

Doces embalados à mão

Maria Creunice Andrade, 58 anos, nasceu em Sergipe, mas se mudou bem pequena para o Paraná. Perdeu a mãe quando tinha por volta dos três, quatro anos de idade. Conta que os irmãos se uniram e foram criando uns aos outros. 

Já casada, se mudou para Franca, 30 anos atrás. Quando se separou, os filhos ainda eram pequenos. 

– Criei meus filhos com ajuda de Deus. 

Fazia de tudo um pouco para manter a casa. Costurava capinhas de CD e cozinhava quitutes para vender. 

– Eu rezei muito para conseguir um emprego. Não queria correr para a barra da saia da família. Eu precisava remar o barco e não deixar afundar. 

Um amigo falou que havia vaga na empresa Flormel. Na época, uma fábrica pequena. Os fundadores começaram em 1984 vendendo balinhas de mel e granola como forma de ajudar nas finanças apertadas. Engravidaram do primeiro filho e, com as contas apertadas, precisaram criar um caminho. 

Três anos depois, em 1987, abriram a fábrica de doces.  

No começo, utilizavam açúcar demerara. Depois, trocaram pelo açúcar orgânico e hoje fazem todos os doces sem adição de açúcares. Creunice acompanhou toda a transição. 

Conta que quando entrou, em 2003, os doces eram feitos à mão. 

– A gente pegava o doce com tachão de cobre, despejava na mesa, abria e ia medir para cortar. Eram embalados um a um. 

Nessa época, ela relembra, usavam o açúcar na fabricação. 

– O que todo mundo está buscando hoje em dia é alimentação saudável. O açúcar está perdendo lugar. 

Funcionária mais antiga da empresa, participou das mudanças. 

– Você tem que fazer dar 100% certo. Não existe 99%. Alguém vai consumir aquela receita. 

Empresa Flormel Franca

Seguir remando

O sorriso sempre no rosto não afasta a seriedade na hora de produzir. 

– Quando eu estou na minha balancinha, não olho nem para o lado. É foco total.
Ela é responsável por separar, pesar e mexer os ingredientes das receitas, para que elas cheguem até a produção prontinhas para o preparo. 

Toda receita tem um segredo, que ela vai carregar consigo bem escondido. 

– Isso eu não conto!

Cozinhar para milhares de pessoas não abre brecha para erros, ela explica. 

– Já aconteceu, sim. Mas, se deu errado, a gente joga fora e recomeça. Aquela receita não vai funcionar. 

Entre seus doces preferidos, está o de leite. Difícil de recusar e cheio de detalhes na produção. 

– A linha leite leva três dias para o preparo. 

Desde setembro de 2019, a Flormel é uma das empresas doadoras do programa Mesa Brasil. Até agosto de 2021, já havia feito 19 doações, totalizando oito toneladas de alimentos para a mesa de quem precisa. 

Para Maria, mais uma alegria na produção. 

– É tão bom ajudar alguém! Poder fazer os nossos doces chegarem a todo mundo! 

A alegria que coloca em cada frase quase faz esconder os desafios da trajetória. Três anos atrás, ela enfrentou a maior onda das marés. Seu filho mais velho faleceu em um acidente de carro, aos 34 anos. 

Ela seguiu, sustentando o sorriso no rosto. 

–  A gente reza. Pede a Deus coragem e sabedoria para levar o barco em frente. 

Com essa força, Maria Creunice adoça os dias amargos que a vida insiste em trazer. 

– Todo dia, peço a Deus para me dar força para mais uma batalha e continuo vencendo. 

Depois dos 60, pensa em aposentadoria. Ainda não sabe, porém, como vai ficar longe das suas receitas. Então, deixa o tempo passar. 

– Ah, vai demorar! 

Conheça mais sobre o Mesa Brasil

Que tal criarmos uma ponte entre quem precisa de ajuda para matar a fome e quem pode e quer fazer o bem? Uma ponte que consiga unir essas duas pontas, fazendo com que os alimentos que sobram para um cheguem à mesa do outro? 

É isso que faz o programa Mesa Brasil, criado pelo SESC SP há 27 anos e presente em todo o país.

Caminhões coletam diariamente doações de alimentos com empresas, supermercados, cerealistas, produtores, entre outros fornecedores e entregam para instituições sociais e hospitais. Só em São Paulo são 30 caminhões circulando todos os dias para atender 63 cidades paulistas. 

Realizando a coleta e a entrega dos produtos, o Sesc São Paulo facilita o caminho para quem quer doar e garante que toneladas de alimentos que seriam desperdiçados cheguem à mesa de quem precisa: uma rede de combate à fome! 

Em tempos de pandemia, o programa se tornou ainda mais fundamental. Só em 2020 foram distribuídos mais de 7.200.000 kg de alimentos, além de 470.000 kg de produtos de higiene e limpeza para 1.150 instituições sociais e 120.000 famílias. Em 2021, já são 2.425.809 kg de alimentos arrecadados. 

Em Ribeirão Preto, o programa existe desde 2014. Dois caminhões passam pelas empresas doadoras pela manhã, para coletar os alimentos doados, e, no período da tarde, levam o que foi coletado para as instituições sociais. Em 2020, o programa coletou 220 toneladas de alimentos e materiais de limpeza e higiene. Atualmente, está com 87 instituições sociais cadastradas e mais de 3000 famílias atendidas.

O Mesa Brasil do SESC Ribeirão atende, além de Ribeirão, as cidades de Serrana, Sertãozinho, Santa Rosa do Viterbo, Guariba, Jaboticabal, Franca e Barretos. Até julho de 2021 já coletou 214 toneladas de alimentos. E os números não param de crescer – ainda bem!

O projeto “Gente que Alimenta” conta as histórias de quem faz esse programa do bem acontecer: doadores e instituições que precisam de apoio para continuarem suas atividades. 

Quer saber mais sobre o Mesa Brasil? Quer se tornar um doador? Acesse o SITE AQUI e se encante ainda mais com esse bonito programa! 

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