Uma tonelada de batatas fritas em chips! É a quantidade que Elaine vende todo mês com seu carrinho decorado e bem organizado.
– O pessoal aqui em Ribeirão gosta de batata! Quem resiste?
Pouca gente. A moça passa e pega um saco grande para levar. A outra já vai comendo um pequeno com uma coca gelada.
A oferta é diária. De segunda à sábado, Elaine trabalha no calçadão de Ribeirão Preto. Aos domingos as vendas são na feira livre da Avenida Portugal, onde ela tem barraca há 14 anos.
Demorou um pouco para encontrar o produto que melhor agradou a clientela. Já vendeu artesanato mineiro, pães caseiros e outros tantos produtos.
Até descobrir a batata, teve um tanto de prejuízo.
– O que não vendia de pão era lucro perdido, desperdício…
Três anos atrás teve a ideia. Percebeu que não havia opções e decidiu arriscar, como fez a vida toda.
– Agora deu certo! Graças a Deus!
Comemora a conquista, fruto de muito trabalho.
Elaine Rodrigues Lopes Pereira nem sabe dizer quando se tornou comerciante.
– Desde que me conheço por gente!
O avô tinha uma fábrica de vassouras e levava a criançada para aprender a embalar, colocar preços. Foi ali seu primeiro “trabalho”, aos 10 anos. Tão pequenina, era responsável por fazer depósitos no banco, de ônibus sozinha até o centro da cidade.
– Meu pai riscava o mapa no caderno e eu ia, com aquele monte de dinheiro. Que criança faz isso hoje? O mundo mudou tudo! É perigoso!
Seu pai também teve um armarinho do estilo “vende tudo”, no Jardim Paulistano. Mais uma experiência para Elaine ainda menina.
Aos 12 anos, ela começou a trabalhar como animadora de festas em trenzinhos infantis. Aos 14, foi para uma livraria. Depois, passou a entregar jornais no Jornal Verdade. Fez bicos, trabalhou como cabo eleitoral para tantos políticos que se perde nos partidos. Foi vendedora em lojas de departamento, postos de gasolina. É muito trabalho na trajetória de 44 anos!
Entre tanto trabalhar, deixou a escola no Ensino Médio. Se casou vinte anos atrás e há cerca de 15 decidiu que iria se arriscar trabalhando por conta. Foi necessário. Tiveram quatro filhas: casa cheia, contas também. O marido perdeu o emprego em uma grande empresa e Elaine, então, teve que buscar uma solução.
– Eu vendia tudo o que aparecia para vender.
Trufas, roupas, calçados, pães, artesanato: a lista é grande. Conseguiram um ponto na feira e abraçaram com vontade. Ela também passou a expor na praça Carlos Gomes, mas as vendas não iam para frente. A crise financeira foi tornando tudo mais difícil, até a ideia surgir.
– Eu nunca tinha visto alguém fazer! E falei: vamos tentar!
Conta que começaram comprando tudo aos pouquinhos. Descascavam e cortavam as batatas na mão, usavam uma fritadeira pequena. A procura fez com que o crescimento viesse.
Comprou o primeiro carrinho parcelado de um vizinho. Os eventos começaram a surgir e foi preciso um maior. Viu um anúncio na internet e conseguiu encontrar o telefone do dono. Negociou direto com ele e, sem conhecê-lo, conseguiu pagar em quatro parcelas.
– No dia em que ele veio aqui negociar, minha filha tinha caído, quebrado o braço: aquela confusão! Eu rezava: ‘Santa Rita, põe amor no coração desse homem!’.
A reza funcionou. Fizeram negócio das antigas: com base em confiança.
De carrinho novo, criaram logomarca: ‘Batata Goldem’ e decoração, que eles mesmos fizeram em casa, com adesivos.
– O plote de pipoca era muito caro! Saiu 10% do valor. Nós medimos, cortamos, colamos.
Trabalho em família, com vontade de crescer!
Ela e o marido dividem as funções diárias. Ele faz a produção das batatas: processamento, fritura, embalo. E Elaine vai para a rua vender.
– Tem que gostar e ter paciência! Eu atendo gente de todo jeito: da maior educação até aquele que te põe lá embaixo, acorda mal-humorado e quer brigar com todo mundo.
Criou uma técnica infalível para lidar com gente de mal com a vida:
– Me faço de surda… finjo que não escuto. Porque vem muita coisa que a gente não merece!
Os elogios, entretanto, são maioria.
– Muita gente volta, diz que gostou, fica cliente!
As filhas, razão de tanta luta, hoje estão com 20, 18, 14 e 7 anos. As mais novas cresceram na feira. As mais velhas já pensam em faculdade, para o orgulho da mãe – e também preocupação. As vendas precisam melhorar mais e mais para que a mensalidade de um curso entre na planilha de gastos.
Mãezona, brinca com a rotina:
– Se eu ganhasse um real a cada vez que uma delas me chama, estaria milionária!
Mas é só brincadeira mesmo:
– A gente tá nessa vida para criar as meninas…
Também faz planos para o futuro. Quem sabe voltar a estudar? Fazer um curso de Administração para aprender mais sobre os negócios?
Por enquanto, porém, a meta é dar conta de toda a demanda de final de ano. Com as lojas do Calçadão funcionando até às 22h, a jornada quase dobra. Começa cedinho, sem hora para acabar. Não reclama, no entanto.
– A vida? Em primeiro lugar é respeitar o próximo. E saber conquistar o que quer. Sempre ensinei minhas filhas: cada um tem seu espaço. Sua liberdade vai onde começa a do seu vizinho. Foi assim que eu aprendi com meu pai.
O carrinho está todo decorado para o Natal: mais um atrativo para a clientela. Batata frita temperada com muita garra: quem resiste?
*Quer traduzir essa história em libras? Acesse o site VLibras, que faz esse serviço gratuitamente: https://vlibras.gov.br/
Assine História do Dia por R$ 13 ao mês ou faça uma doação de qualquer valor AQUI.
Nos ajude a continuar contando histórias!
0 comentários