Guariba: Família de Reginara encontra no Cristo Rei afeto e acolhimento

13 outubro 2021 | Destaque, Gente que alimenta, Projetos especiais

Texto: Daniela PenhaFotos: Sheila BrandãoIlustração: Cordeiro de Sá- Produção: Vandreza Freiria

Por muitos anos, Reginara de Souza passou pela porta do Centro Social Comunitário Cristo Rei contendo a vontade de entrar. Uma das filhas mais velhas entre oito filhos, ela ajudava a mãe a cuidar dos pequenos. Então, tinha que levar e buscar seus dois irmãos na porta e voltar para os afazeres domésticos de casa. Tinha só 12 anos. 

– Sabe aquela vontade de entrar? Eles participavam da banda marcial. Viajaram muito com o Cristo Rei! Eu ficava doidinha para participar também! 

Mesmo sem poder frequentar as atividades, porém, a instituição foi degrau para seu crescimento. Com o apoio do Centro Social, ela conseguiu seu primeiro trabalho formal, como jovem aprendiz, aos 14 anos. Todo o processo seletivo e os anos em que trabalhou marcaram sua trajetória. 

– É gratificante saber que eu poderia ter ido para caminhos piores, mas fui em frente, construí minha família. 

Reginara, desde então, tece com o Centro Social, em Guariba, uma história de afeto, que reverbera ainda hoje. Dois de seus quatro filhos, de 11 e 9 anos, frequentam o Cristo Rei, o que possibilita que a mãe trabalhe com o coração mais tranquilo. 

A rotina da casa com quatro crianças pequenas é cheia de desafios, que ficam um pouco mais amenos com o acolhimento que recebem ali. 

– Eu incentivo meus filhos a sonhar. Tem que sonhar e ter um objetivo para traçar sua vida! 

Centro Social Cristo Rei Guariba

Ajudando a mudar rumos

Neste ano, o Centro Social Comunitário Cristo Rei comemora meio século de atividades. Acolhem crianças e adolescentes no contraturno escolar, com atividades multidisciplinares como esportes, música, artesanato e informática.  

Além do Cristo Rei, o Centro Social Comunitário São Matheus, também administrado pela igreja católica de Guariba, realiza o mesmo trabalho, em um bairro distinto. As entidades têm coordenações diferentes, mas desempenham, igualmente, um importante papel, com atividades similares. 

Juntas, as duas instituições atendem cerca de 140 meninos e meninas de 6 a 14 anos. – O intuito é que eles saiam daqui com uma formação para o futuro. Que possam transformar a realidade que vivem.

Explica a psicóloga Isis Grassi Gutierrez, que atua nos dois centros.  

Na pandemia, o trabalho precisou ser adaptado. Passaram a enviar atividades para a criançada fazer em casa, mas também foi preciso outro reforço. 

Muitos perderam seus empregos e viram a situação financeira apertar. As instituições, então, começaram a preparar cestas de alimentos, que são retiradas pelas famílias das crianças atendidas. 

A instituição Cristo Rei foi cadastrada no programa Mesa Brasil em outubro de 2020 e já recebeu 10 doações, com o total de 926 quilos de alimentos. 

A família de Reginara é uma das que precisam desse apoio. Ela é faxineira e o marido trabalha em usinas, mas só no tempo da safra. Os trabalhos diminuíram bastante. 

– Eu tenho muita fé. Apesar de as coisas não estarem fáceis, nada está perdido. 

Com as sacolas de alimentos nas mãos, ela e os filhos saem sorridentes do Centro Comunitário. Reginara, que soma desafios desde bem pequena, garante que não deixa o desânimo tomar conta. 

– Eu tenho uma história incrível! 

Vai logo dizendo. 

Centro Social Cristo Rei Guariba

Adolescência de desafios

Reginara, 28 anos, nasceu em Guariba, cidade onde passou toda a vida. Sua mãe precisou criar sozinha os oito filhos. Então, para os mais velhos as tarefas eram muitas. 

– Eu não me recordo de brincar. Foi uma infância de muitas obrigações. 

Como ela levava os irmãos menores ao Centro Social, para as atividades com a banda, foi ficando conhecida pela equipe. Frequentava as reuniões e encontros, participava como podia. 

Em, 2009, quando tinha 14 anos, foi chamada para concorrer a uma vaga de menor aprendiz em uma usina. A proposta era que apenas as jovens matriculadas no Centro Social concorressem. Mas Reginara era tão de casa que abriram uma exceção. Por ali, também já se sabia da vontade da adolescente em participar das atividades. 

– Eram 30 inscritas, mas uma menina desistiu. E a diretora do Cristo Rei me chamou. Já fui pedindo para a minha mãe. Mas era uma vaga só para 30 meninas! 

Além dos afazeres da casa, nessa época Reginara trabalhava com a mãe, no campo. Colhiam laranja, amendoim, cebola. Saíam de casa quando ainda era madrugada, voltavam no final da tarde e ela corria para a escola, no período noturno. 

O trabalho na usina, assim, viria como uma oportunidade. 

O processo seletivo foi um exercício de confiança. 

– Eu coloquei aquele mesmo sapato e a mesma roupa que tinha para toda ocasião especial. Sabe aquela calça que você lava, lava e só tem aquela? Quando cheguei, vi aquelas meninas todas arrumadas, de escova no cabelo, maquiagem… 

A mãe foi quem a levou. Quando viu a concorrência, avisou: ‘Se não der certo, tudo bem. Aconteça o que acontecer é uma experiência’. 

– Eu acho que ela também duvidou que iria dar certo. 

Mas deu. Mesmo com os desafios. 

Entre uma etapa do processo seletivo e outra, sua mãe ficou doente. Para não ficarem sem o dinheiro do mês, Reginara fez a cota da mãe na colheita da laranja. No sábado, dia do processo, estava tão cansada que pensou em não ir. 

– Mas minha mãe falou: ‘Você vai, sim!’. 

Empatou com outra concorrente e, assim, a usina decidiu contratar as duas. 

– Eu aprendi muita coisa ali! A gente era muito disputada. Então, passava por todos os setores e aprendia um pouco de tudo. 

Centro Social Cristo Rei Guariba

Seguir sempre 

Saiu da usina por volta dos 17 anos. Já estava namorando. Engravidou do filho mais velho, de 11 anos, e se casou.

Terminou o Ensino Médio e fez cursos de telefonista, auxiliar administrativa, balconista. Não conseguiu emprego nessas áreas. Trabalhou como faxineira e na roça. 

Teve três filhos com seu marido. Conta que viveram bem até ele falecer, em 2014. Foi assassinado em uma briga. 

– Quando eu tô triste, olho para os meus filhos. Eles são inocentes, dependem de mim. É isso que me mantem em pé a cada dia. Faço deles a minha fortaleza. 

Se casou de novo cinco anos atrás e teve a caçula, que está com dois aninhos. 

Os desafios se atualizam, dia a dia. A pandemia diminuiu os trabalhos e tirou as crianças da escola presencial. A mãe precisou se reinventar. 

– Enquanto tiver uma pessoa boa, querendo fazer o bem sem olhar a quem, o mundo ainda não está perdido. 

Recebe as doações do Centro Social, conta com ajuda de vizinhos e vai seguindo. 

É verdade: as coisas não saíram como ela planejara lá atrás, quando teve a oportunidade de trabalhar como aprendiz. Os caminhos foram para um rumo diferente. 

Mas não reclama em nenhum momento da narrativa. Vai entregando para os filhos a possibilidade de sonharem e, quem sabe, realizarem. 

– Eu quero que eles tenham um futuro bom. Falo para eles agarrarem todas as oportunidades que aparecerem. 

Segue. Sabe que ainda tem muita história para escrever pela frente. 

– Você pode ser um no meio de 100. Se tiver o coração bom, consegue contagiar todos os outros.  

Sem fechar o sorrisão do rosto. 

Conheça mais sobre o Mesa Brasil

Que tal criarmos uma ponte entre quem precisa de ajuda para matar a fome e quem pode e quer fazer o bem? Uma ponte que consiga unir essas duas pontas, fazendo com que os alimentos que sobram para um cheguem à mesa do outro? 

É isso que faz o programa Mesa Brasil, criado pelo SESC SP há 27 anos e presente em todo o país.

Caminhões coletam diariamente doações de alimentos com empresas, supermercados, cerealistas, produtores, entre outros fornecedores e entregam para instituições sociais e hospitais. Só em São Paulo são 30 caminhões circulando todos os dias para atender 63 cidades paulistas. 

Realizando a coleta e a entrega dos produtos, o Sesc São Paulo facilita o caminho para quem quer doar e garante que toneladas de alimentos que seriam desperdiçados cheguem à mesa de quem precisa: uma rede de combate à fome! 

Em tempos de pandemia, o programa se tornou ainda mais fundamental. Só em 2020 foram distribuídos mais de 7.200.000 kg de alimentos, além de 470.000 kg de produtos de higiene e limpeza para 1.150 instituições sociais e 120.000 famílias. Em 2021, já são 2.425.809 kg de alimentos arrecadados. 

Em Ribeirão Preto, o programa existe desde 2014. Dois caminhões passam pelas empresas doadoras pela manhã, para coletar os alimentos doados, e, no período da tarde, levam o que foi coletado para as instituições sociais. Em 2020, o programa coletou 220 toneladas de alimentos e materiais de limpeza e higiene. Atualmente, está com 87 instituições sociais cadastradas e mais de 3000 famílias atendidas.

O Mesa Brasil do SESC Ribeirão atende, além de Ribeirão, as cidades de Serrana, Sertãozinho, Santa Rosa do Viterbo, Guariba, Jaboticabal, Franca e Barretos. De janeiro até agosto de 2021 já coletou 132 toneladas de alimentos. E os números não param de crescer – ainda bem!

O projeto “Gente que Alimenta” conta as histórias de quem faz esse programa do bem acontecer: doadores e instituições que precisam de apoio para continuarem suas atividades. 

Quer saber mais sobre o Mesa Brasil? Quer se tornar um doador? Acesse o SITE AQUI e se encante ainda mais com esse bonito programa! 

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1 Comentário

  1. Meire Eleni Pereura

    “Enquanto existir uma pessoa boa…” verdade. Uma pessoa de bom coração abre caminhos, acolhe outras pessoas, torna a vida do próximo mais leve e dá esperança de que as coisas podem acontecer.
    Adorei a história. Reginara é uma guerreira e ainda pode conquistar muita coisa com seus filhos.

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