Há 24 anos, Carlos Zanoello é o apresentador do Jornal da Clube

10 março 2020 | Histórias do Proac 2019/2020

Texto e foto de destaque: Alice de Carvalho Leal

 

Todos os dias, há anos, a rotina é a mesma. Ao acordar, uma caminhada para manter a saúde em dia. Após o almoço, sai da zona Norte de Ribeirão Preto e vai até o Centro da cidade com seu Corsa Hatch vermelho ano 1996. O destino é o Sistema Clube de Comunicação, mais especificamente o estúdio do Jornal da Clube.

O relógio de ponto registra a hora certa de quem preza pela pontualidade. Ao chegar, deixa de lado a calça jeans e camiseta para se vestir como o âncora da segunda edição do jornal diário. A camisa branca de manga comprida funciona como um uniforme, acompanhada do paletó e uma gravata diferente da coleção.

A cada notícia recebida, uma passada de olho e alguns ajustes são feitos. O que precisa ser gravado, é gravado na hora. A pausa no meio do expediente é feita na barraca de frutas do Celso, bem ao lado da empresa. E, assim, Carlos Zanoello deixa tudo pronto, somente aguardando o horário de entrar ao vivo no final do dia.

– Se um avião cair, a gente tem que estar preparado para correr!

Por trás da tela da televisão e da ordem de atividades, há muita história para contar. A começar pelo nome do meio, que quase ninguém conhece: Alberto. Foi daí que surgiu o apelido adotado pelos familiares. Em casa, Zanoello é o Beto, o mais velho de quatro filhos, pai cuidadoso e amigo.

Natural de Altinópolis, morou na cidade com a família até os sete anos de idade. O pai trabalhava em uma usina de laticínios e foi transferido para gerenciar a unidade de Franca.

– Quando completei 14, meu pai recebeu convite para gerenciar outra usina, dessa vez em Pedregulho. Eu não quis ir, o que ia fazer em uma cidade menor do que Franca?

A escolha de ficar sozinho foi o primeiro passo para garantir a independência que queria. Morou com a avó em uma casa de fundos. Ainda estudando, conseguiu arrumar emprego em um despachante logo que os pais se mudaram. Ele brinca:

– Não é por acaso que já estou aposentado hoje, aos 55 anos!

Trabalhou cerca de três anos e meio por lá até entrar na faculdade. Jornalismo? Não, Administração. Cursou somente um ano e meio e não se identificou. Além disso, quase todo o dinheiro que ganhava acabava gastando com os estudos. Optou, então, por deixar a área de lado.

– Minha família é humilde, nunca “sobrou”, sabe? Meu pai sempre me ajudou muito, mas eu tinha que me virar.

Carlos Zanoello TV Clube Ribeirão Preto

Em 1983, soube da abertura de um processo seletivo para trabalhar como auxiliar de escritório nos Correios. Deu um jeito de vir até Ribeirão Preto para prestar a prova. Disputou com 30 candidatos e deixou todos para trás. Zanoello garantiu o primeiro lugar no concurso e uma vaga na agência central dos Correios de Franca. Foi alocado no departamento correspondente ao Sedex de hoje em dia.

Um ano depois, enxergou uma nova possibilidade de evoluir dentro da empresa. Prestou um concurso interno e se tornou operador de teleimpressores. Semelhante a uma máquina de escrever, o aparelho permitia a transmissão de informações em forma de texto.

– Parecia uma máquina de tirar xerox, como se fosse de datilografia. Era a única maneira do representante comercial passar os pedidos para a empresa, já que não tinha celular.

Ele se tornou responsável por receber telegramas e passar telex.

Na época, a forma mais urgente de se comunicar, sem ser por telefone, era através de um telegrama fonado. A mensagem, nesse caso, era transmitida pela voz do operador. A pessoa ditava a mensagem, que depois precisava ser repetida para confirmação. “Fulano, parabéns pelo casamento, que dê tudo certo ao casal. Abraços do Beltrano”.

– Um dia, um colunista social mandou quatro ou cinco mensagens. Depois de eu repetir, ele virou e falou: ‘Nossa, você tem uma voz bonita!’. Nunca pensou em ser locutor de rádio?

Talvez esse tenha sido o estalo que precisava.

– Eu falei que não. Então ele disse que era amigo do proprietário da rádio local “Três Colinas FM” e iria falar de mim. Depois disso, minha vida mudou. Não conseguia pensar em mais nada!

Zanoello sempre gostou de música. O passatempo favorito ao chegar em casa era ligar o aparelho de som e passar horas ouvindo. Tinha também um microfone, onde simulava a gravação de propagandas que passavam no rádio. Mas parecia que a conversa entre o cliente não ia passar de um bate-papo de balcão. Até que em uma sexta-feira o proprietário da rádio apareceu.

– Ele foi postar uma encomenda e nós conversamos. Então, disse: ‘Domingo, às três horas da tarde, você pode chegar lá e trabalhar. Vai uma hora mais cedo para o rapaz te ensinar tudo e já começa’.

No auge dos seus 22 anos, agarrou a oportunidade com unhas e dentes, sem pensar duas vezes, mas não deixou o trabalho concursado.

Carlos Zanoello TV Clube Ribeirão Preto

Lá estava ele no domingo, às duas da tarde. A rádio era pequena, tinha somente o essencial. Todos os comerciais da programação eram inseridos manualmente através de cartucheiras. Era preciso separar o material, inserir o cartucho e dar play. Quando acabava, tinha que dar stop, tirar o cartucho e separar o próximo. Enquanto isso, outras emissoras já rodavam até CD.

O horário do domingo durou somente um mês, até ser transferido para a madrugada. O expediente começava às dez horas da noite e acabava três horas depois. Ele ficou responsável por finalizar os trabalhos diários da emissora. Era preciso desligar todos os aparelhos, desativar o transmissor e fechar o espaço.

Um ano depois, começou a colher frutos do trabalho bem feito. O reconhecimento veio através de uma ligação da Clube FM, uma grande rádio de Ribeirão Preto. A indicação, segundo ele, foi do amigo Beto Mazza. Apesar da ânsia por aceitar, pensou muito. Como iria deixar os Correios para trás?

– Nessa época, o rádio era mágico! Só tinha feras na locução: Paulinho Paradise, Bananeira, Joel Arruda, Marcelo Sat, Celso Portiolli… pensei: se eu não for, vou viver frustrado.

E o elenco da Rádio Clube ganhou Carlinhos Zanoello.

Carlos Zanoello TV Clube Ribeirão Preto

Durante um ano e quatro meses, optou pela jornada dupla. Nos Correios, trabalhava uma semana no período da manhã e outra durante a tarde. Todos os dias, embarcava em um ônibus às oito horas da noite, em Franca. Chegava em Ribeirão Preto por volta das dez. Da rodoviária, subia a pé até a avenida Nove de Julho para trabalhar das onze às duas horas da madrugada.

Para conseguir enfrentar o expediente no dia seguinte, era preciso descansar. Assim que encerrava a locução, se aconchegava em um pequeno sofá da própria rádio. Ali dormia pouco mais de duas horas, até começar tudo de novo. Corria para o terminal rodoviário e embarcava novamente para Franca.

Tentou a todo custo conseguir a transferência pelos Correios para Ribeirão, mas não conseguiu. Até que sofreu um acidente de moto e quebrou o punho. Precisou tirar licença do trabalho e faltar da rádio.

– No dia seguinte, quando voltei para a Clube, encontrei o proprietário no corredor. Ele me convenceu a abandonar o cargo concursado e mudar para Ribeirão. Vim de mala e cuia, sozinho, aos 23 anos.

Até conseguir se estabilizar, morou na casa de um amigo, que também era locutor. Depois, conseguiu alugar uma casa e o horário de trabalho melhorou. Deu início à faculdade de Jornalismo, mas não conseguiu acompanhar por conta do expediente puxado. Casou em 1992 e, dois anos depois, nasceu a primeira e única filha: Júlia.

Carlos Zanoello TV Clube Ribeirão Preto

O ano de 1996 foi marcado pelo início de uma nova aventura.

– O presidente do Sistema Clube de Comunicação me chamou para uma reunião, disse que estava implantando um jornal na televisão e queria que eu entrasse nessa empreitada com ele. Eu topei!

Em março daquele ano, foi ao ar o jornal Rede Cidade, com Carlos Zanoello na apresentação. O programa era transmitido durante a tarde e não tinha duração estipulada. Ele, que nunca tinha tido contato com televisão, aprendeu tudo na marra. Meses depois, Rede Cidade passou a se chamar Jornal da Clube.

Ele conciliou a locução no rádio com a apresentação na televisão. Apesar da carreira profissional ter dado uma alavancada, em casa as coisas esfriaram. O casamento não deu certo, mas deu a ele uma companheira.

Arrisco dizer que, se Zanoello tivesse um dicionário próprio, a palavra “vida” não teria outro significado a não ser Julia. Com a separação, em 2002, a menina, que tinha oito anos, optou por morar com o pai e assim seguem juntos até hoje.

– Foi um baque, ainda mais com filha pequena para criar e ela só chorava. Se não estivesse comigo, ela estava chorando.

Conciliar a rotina puxada com a criação da filha não foi fácil. Para isso, contou com a ajuda de um irmão, que veio morar com eles. Até que, em 2009, após 13 anos se dividindo entre o microfone e as câmeras, passou a ter jornada única na televisão. Não foi fácil, ele confessa, mas teve que deixar o rádio para trás.

– Fiquei chateado na época, não nego. Mas hoje, olha só, vai fazer 24 anos que apresento o Jornal da Clube.

A vida na televisão não fez com que Zanoello vivesse de luxo ou mudasse os ideais que carrega, muito pelo contrário. Durante todos esses anos, as raízes da simplicidade só se fortaleceram. Dentro de casa, assume ser um “faz tudo”: lava, passa, limpa e cozinha.

O lema sempre foi não deixar a ambição falar mais alto, a ponto de dar o passo maior do que a perna.

– Não dou bola para roupa, sapato e restaurante chique. Em todo lugar que vou, estou com meu Corsinha. A gente aprende a dar valor para as coisas certas, sabe?

Aposentado, ele não sabe dizer até quando vai continuar trabalhando. Mas uma coisa é certa: enquanto estiver, de segunda a sexta-feira, às sete e vinte da noite, o telespectador que ligar a televisão vai ter o prazer de escutá-lo dizendo:

– Uma feliz noite e muito obrigado pela sua audiência.

 

*Quer traduzir essa história em libras? Acesse o site VLibras, que faz esse serviço gratuitamente: https://vlibras.gov.br/

 

Assine História do Dia por R$ 13 ao mês ou faça uma doação de qualquer valor AQUI.

Nos ajude a continuar contando histórias!

Compartilhe esta história

14 Comentários

  1. cristian mary girolinetto

    ele é tudo isso verdade cada palavra, é muito mais, tive a oportunidade de trabalhar com ele na década de 90 na Clube Em e sempre foi um cara especial, educado, merece essa homenagem é reconhecimento.

    • Carlos Alberto Garcia

      Bela história de superação!!

      • Paulo César

        Boa tarde estamos com saudades de vc Carlos zanduelo lá na clube abraço!

  2. Marcio Vianna

    Zanoelo é sensacional educação impecável parabéns

  3. Carmen zanoello

    Tenho orgulho do meu irmão,sempre firme e honesto é um pai maravilhoso,um filho ótimo, parabéns Beto.

  4. Ana Cristina Zanoello Rocha

    Te amo irmão. Obg por existir. Um exemplo para todos nós.

    • William Credidio

      Onde esta Carlos Zanoello

  5. Marisa Claus Vieira

    Parabéns pelo esforço e perseverança, sucesso sempre!

  6. Susana Bissi

    Admiro muito o Beto e sua linda família! Conheço desde criança! Meu pai era seu fã número um! Parabéns meu amigo querido!

  7. Olívio Borges

    Parabéns pela coragem, esforço humildade! Admiro a garra nas empreitadas da vida. Abraços

  8. Helena Rezende

    Desde que o vi ali parado na fila do açougue (ano de2012 dia 23/ 12) percebi que era uma pessoa linda .Com o passar do tempo eu soube quem era até então não sabia de quem se tratava aquela pessoa ali na fila. Eu trabalhava no mercado por isso pude e tive oportunidade de falar pessoalmente com ele, uma pessoa respeitadora e humilde sem contar essa voz linda que tem Carlos Zanoello entre nós o chamamos de Zaza. Parabéns por ser essa pessoa que não desiste diante das circunstâncias da vida.
    Obrigada por fazer parte do nosso dia a dia.

  9. Cristiany Aparecida Ferreira de Freitas

    Tenho uma admiração enorme por esse ser humano! Saudades do nosso tempo de rádio!! Grande Zanoello! Que honra poder ter te conhecido!
    Um grande abraço….

  10. luciana vecchi

    Carlos Zanoello, estou sentindo sua falta no Jornal da clube!!!Quando você volta?

  11. William Credidio

    carlinhos se assim posso te chamar, pois acompanho sua trajetória desde da época da Clube Fm, não sei se lembra meu nome é William, foi apresentado à vc na festa de casamento do amigo comum (hj falecido) Popeye. Para sua lembrança conversamos e na epoca antecipei teu futuro como ancora de telejornal. Disse também sobre o Paulinho as melhores vozes de Ribeirão. Um forte abraço

Outras histórias