Jaboticabal: Maristane ajudava mãe a colher algodão e hoje cursa segunda pós-graduação

10 novembro 2021 | Destaque, Gente que alimenta, Projetos especiais

Texto: Daniela Penha Fotos: Sheila Brandão Ilustração: Cordeiro de Sá – Produção: Vandreza Freiria

O campo de algodão branquinho, branquinho com aqueles chumaços que pareciam neve. Entre as lembranças da infância, está a imagem, nítida. Ainda pequenina, Maristane saía puxando os ramos e guardando no saco de colheita, amarrado na cintura.  

 É uma das memórias do tempo em que ia com a mãe para o trabalho na lavoura. Ela era criança, mas guardou tudo. O corpo também ficou marcado em cicatrizes com aquela beleza traiçoeira. 

– Algodão é bonito, mas machuca muito na hora de colher. Ficou na memória e na pele: bem registrado. 

Começou a ajudar a mãe no trabalho rural bem pequena. Mas, na volta para casa, relembrava o objetivo do caminho. Morava perto do campus da Unesp, em Jaboticabal. E sonhava um dia estudar ali. 

Realizou o sonho e foi além. Maristane Aparecida Pinheiro Santos, 35 anos, foi a primeira de sua família a conquistar um diploma universitário. Cursou a graduação em Administração de Empresas, na Unesp. E não parou. Fez sua primeira pós-graduação em Logística, na Universidade Cruzeiro do Sul, e hoje está cursando a segunda, em Gestão de Pessoas, na USP Piracicaba.  

– O estudo te faz ir além, abre portas. O conhecimento ninguém tira de você. Ele pode nos libertar de qualquer coisa. Minha mãe sempre priorizou isso. 

Há 13 anos, ela é funcionária da M. Dias Branco, uma das maiores indústrias de alimentos do Brasil e uma das principais do mundo no segmento de massas e biscoitos. 

Entrou em 2008. Conta que foi a primeira estagiária da instituição em Jaboticabal. 

– Se você vive na cidade, conhece alguém que trabalhou aqui. As pessoas têm muito carinho pela empresa. 

Hoje, é líder de logística. Responsável pelo centro de distribuição da empresa em Jaboticabal, coordena as entregas, organização, indicadores, despesas. São cerca de 300 toneladas de alimentos ao dia, entre carregamentos e recebimentos. 

Entre as demandas, estão também os alimentos destinados às doações. A M. Dias Branco é uma das empresas doadoras do programa Mesa Brasil. Cadastrada desde junho de 2020, já doou 34 toneladas de alimentos a quem precisa.

Maristane explica que as doações sempre ocorreram, mas com a pandemia e a maior necessidade das famílias, acharam fundamental aumentar o fluxo.  

– Estamos vivendo um momento muito difícil. Poder ajudar o próximo faz toda a diferença. As maiores doações são para o Mesa Brasil porque sabemos que os alimentos chegam a hospitais, asilos, orfanatos: um leque grande de instituições. 

A mãe, que hoje está com 59 anos, acompanha orgulhosa os voos da filha. Ainda vem muito por aí, Maristane garante. 

M Dias Branco Jaboticabal

Força que vem de mãe 

A família é de Minas Gerais, pequena cidade do interior chamada Araçuaí. Maristane é a caçula de três filhos. Quando tinha três anos, sua mãe se separou e partiu sozinha para São Paulo, com as crianças pequenas. 

Parte da família já havia iniciado a empreitada. Deixaram Minas para trabalhar nas lavouras de São Paulo, em busca de melhores condições. 

– Minha mãe trabalhou a vida toda como boia-fria. Jaboticabal nos acolheu e nos deu oportunidades. 

Ainda crianças, os filhos acompanhavam a mãe no campo. Aos 11 anos ela já ajudava no trabalho. Além do algodão, também iam para as plantações de amendoim, tomate, cebolas. “De tudo um pouco”, como diz. 

– Só quem passou pelo trabalho rural sabe o quanto é doloroso. É muito árduo. 

Entre os espinhos e marcas da colheita, há também as boas lembranças. 

– Quando dava um tempo, a gente inventava brincadeiras ali mesmo. Pegava mangas dos pés depois que terminava o serviço. Passamos por perrengues grandes, mas sempre fomos muito unidos. 

A mãe exigia que os filhos estudassem, mesmo com o trabalho. 

– A história dela me inspira muito. Estudou até a quarta série e é uma mulher muito inteligente, esclarecida. Sempre esteve com a gente. 

Na adolescência, então, Maristane começou a trabalhar como babá no contraturno da escola. Depois, trabalhou em um laboratório. Conta que o incentivo para a faculdade veio também dos professores, na escola pública onde estudou. 

– Eles me deram um norte, me apresentaram a universidade pública. 

Passou em Administração de Empresas na Unesp em 2008, e seguiu estudando, com a pós-graduação. 

– Me orgulho muito dessa história da minha família. 

M Dias Branco Jaboticabal

Concentração e trabalho em grupo

Quando se formou, em 2014, Maristane já trabalhava na M. Dias Branco. 

Participou do processo seletivo para o estágio e foi aprovada. 

Trabalhava o dia todo e corria para a faculdade, no período noturno. 

Depois, do estágio, foi efetivada e continuou por ali, crescendo. 

Para coordenar tantas toneladas de alimento diariamente, explica que é preciso concentração e trabalho em grupo. 

– Eu vesti a camisa. E a equipe é muito envolvida no que precisa fazer. 

A mãe se aposentou, a pedido dos filhos. 

– Ela tem 59 anos, mas carrega as sequelas do trabalho duro que fazia. Queremos que possa ter o descanso que merece. 

Curte os netos e gosta de viajar. Assim como Maristane, que tem uma porção de planos para o futuro. 

– Quero crescer no âmbito profissional, há lugares nos quais quero chegar. Também quero viajar, conhecer. Estou me preparando. 

Aos sobrinhos, conta a história de sua família como incentivo. 

– Eu procuro passar para eles o que aprendi. Não foi uma vida fácil, mas trouxe uma maturidade muito grande para aprender a valorizar o que eu tenho. 

No campo de algodão branquinho, branquinho Maristane imaginou um futuro diferente e plantou sonhos. Hoje, colhe conquistas. 

Conheça mais sobre o Mesa Brasil

Que tal criarmos uma ponte entre quem precisa de ajuda para matar a fome e quem pode e quer fazer o bem? Uma ponte que consiga unir essas duas pontas, fazendo com que os alimentos que sobram para um cheguem à mesa do outro? 

É isso que faz o programa Mesa Brasil, criado pelo SESC SP há 27 anos e presente em todo o país.

Caminhões coletam diariamente doações de alimentos com empresas, supermercados, cerealistas, produtores, entre outros fornecedores e entregam para instituições sociais e hospitais. Só em São Paulo são 30 caminhões circulando todos os dias para atender 63 cidades paulistas. 

Realizando a coleta e a entrega dos produtos, o Sesc São Paulo facilita o caminho para quem quer doar e garante que toneladas de alimentos que seriam desperdiçados cheguem à mesa de quem precisa: uma rede de combate à fome! 

Em tempos de pandemia, o programa se tornou ainda mais fundamental. Só em 2020 foram distribuídos mais de 7.200.000 kg de alimentos, além de 470.000 kg de produtos de higiene e limpeza para 1.150 instituições sociais e 120.000 famílias. Em 2021, já são 2.425.809 kg de alimentos arrecadados. 

Em Ribeirão Preto, o programa existe desde 2014. Dois caminhões passam pelas empresas doadoras pela manhã, para coletar os alimentos doados, e, no período da tarde, levam o que foi coletado para as instituições sociais. Em 2020, o programa coletou 220 toneladas de alimentos e materiais de limpeza e higiene. Atualmente, está com 87 instituições sociais cadastradas e mais de 3000 famílias atendidas.

O Mesa Brasil do SESC Ribeirão atende, além de Ribeirão, as cidades de Serrana, Sertãozinho, Santa Rosa do Viterbo, Guariba, Jaboticabal, Franca e Barretos. De janeiro até agosto de 2021 já coletou 132 toneladas de alimentos. E os números não param de crescer – ainda bem!

O projeto “Gente que Alimenta” conta as histórias de quem faz esse programa do bem acontecer: doadores e instituições que precisam de apoio para continuarem suas atividades. 

Quer saber mais sobre o Mesa Brasil? Quer se tornar um doador? Acesse o SITE AQUI e se encante ainda mais com esse bonito programa! 

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