Jorge quer a cultura ao alcance de todos

16 setembro 2019 | Histórias do Proac 2019/2020

Quando pequeno, Jorge dizia que não queria ser músico.

O pai, oficial da aeronáutica, era compositor. Pelo distanciamento com ele, o menino cresceu afirmando que não desejava a música como herança. Não adiantou falar, entretanto. Algo de músico já pulsava dentro de si.

Quando fez 18 anos, se rendeu. Vendeu a moto que tinha para comprar um saxofone. Começou a aprender e nunca mais parou de tocar.

Não se limita a arte que vem em acordes, no entanto. É um entusiasta da cultura em suas muitas – e belas – formas. E a leva para todos os espaços.

Há sete meses, por exemplo, organiza sessões mensais de cinema na praça Rômulo Morandi, Campos Elíseos, bairro onde cresceu e vive ainda hoje. Um carro de som passa pelas ruas avisando qual o filme da vez, a estrutura é montada em espaço aberto, ele organiza tudo.

Há três anos, também organiza um festival de jazz na mesma praça, Ribeirão Jazz Festival, trazendo músicos do Brasil e de outros países para se apresentarem ao ar livre. São doze horas ininterruptas de shows. Os profissionais, ele conta, vêm de maneira voluntária, sem cobrar cachê.

– Meu sonho é conseguir pagar os custos e também o cachê que cada músico merece.

Participa de projetos sociais, fazendo sua música de maneira voluntária e se envolve em ações diversas, como o Banho Solidário, que leva dignidade a moradores de rua. Um vídeo de Jorge tocando para os atendidos levou inspiração para as redes sociais.

– Isso me traz uma satisfação tão grande… se uma pessoa ficar admirada, eu já sei que aquilo foi importante para ela.

https://www.facebook.com/BanhoSolidarioRP/videos/2301471123506737/

 

Para o público, todos esses eventos são gratuitos e acessíveis. Para Jorge, custam um tanto de empenho e outro de teimosia. Busca incentivo com a iniciativa pública e privada, vence desafios diários para fazer acontecer.

– O Brasil está vivendo um momento completamente estranho. A tendência é o barco afundar e a gente não vai sair dessa sem doar, propor, entregar nossa experiência em prol de alguém.

Experiência que tem de sobra, não só em ritmo e som.

– Eu sou um músico profissional e há responsabilidade nisso. É minha obrigação ensaiar, ser um bom instrumentista. Mas só isso é muito pouco como ser humano. Mesmo que através disso eu consiga sustentar minha família, eu acho que a gente é capaz de desenvolver outras mil coisas que nos transformam em pessoas melhores e podem mudar o mundo a nossa volta.

Pautado por esse pensar, vem construindo sua carreira entre os palcos, as praças, as ruas, os espaços onde quer ver a cultural chegar.

Jorge Nascimento Músico Ribeirão Preto

Jorge nasceu no Rio de Janeiro, mas chegou a Ribeirão Preto com pouco mais de dois anos de vida, junto com sua mãe. Ela passou um tempo trabalhando no Rio, onde conheceu o pai dele. As coisas não deram certo, porém, e os dois voltaram para o interior de São Paulo.

Depois que decidiu ser músico, ele passou a dedicar sua rotina aos acordes. Integrou a banda “É tudo cena dela”, que ficou muito conhecida em Ribeirão no início da década de 90. Tocaram mais de dez anos juntos, até cada músico seguir seu caminho, por volta de 1999.

Conta que entrou no curso de Musicoterapia e depois no de Música, mas não conseguiu concluir pela correria atrelada ao aperto do bolso. Não desistiu, entretanto. Há cerca de um mês, se matriculou novamente.

– Esse eu pretendo terminar!

Desde 2012, começou a atuar também na produção de espetáculos. Levou projetos diversos a palcos de toda região – e fora dela.

Como músico e/ou produtor, viajou por lugares do mundo todo compartilhando cultura. Um dos projetos, Sonamos Latinoamérica, lhe trouxe laços e amigos. Os músicos que conheceu tocando no Peru vieram a Ribeirão Preto levar jazz à praça, de maneira voluntária.

Agora, recebeu convite para realizar o projeto na Alemanha. E já povoa a mente com planos para que ele saia no ano que vem.

Jorge Nascimento Músico Ribeirão Preto

Jorge tem ideias que saltitam na mente. Diz que nunca está com um projeto só. Divide a rotina em tantos deles e nos próximos que está a pensar. Ainda encontra fôlego para participar com a esposa na administração de um restaurante.

Conta que anos atrás imprimiu cartões de visita e se auto denominou: “facilitador cultural”. Teve gente que não entendeu.

– Eu me identifiquei com esse termo. E hoje consigo ver que sou exatamente isso. Eu consigo realizar ideias que as pessoas se predispõem, mas às vezes não conseguem pôr em prática. Dá trabalho, mas é tão natural, é tanta satisfação. Essa questão da responsabilidade social é muito forte em mim.

Se angustia quando vê que o poder público, cada vez mais, desmerece a cultura, ao invés de priorizá-la:

– A cultura é totalmente transformadora, quando você se propõe a trabalhar com ela. É uma ferramenta que abre um canal de comunicação. Quando a pessoa está em uma ação cultural, ela se torna vulnerável. E é justamente na vulnerabilidade que a gente consegue propor alguma coisa, tentar mostrar algo diferente, sem arramaras.

Vê o resultado na prática. A praça Rômulo Morandi deixou de ser um problema no bairro. O abandono foi substituído por cuidado. Os moradores cuidam e exigem que a prefeitura também faça sua parte. Desde a primeira edição do “Cinema na praça” estima que mais de 200 pessoas já prestigiaram as sessões.

Jorge conversa com a população do bairro, procura saber quais os filmes que mais atraem a atenção. O carrinho de lanches empresta a energia, uma banquinha de livros é montada e até enfermeiros medem a diabetes e a pressão de quem chega.

– A partir do momento em que essa praça foi ocupada, quase todo dia tem alguém limpando, cuidando. Isso mostra que o caminho está correto. O espaço é nosso, é público. E pode ser ocupado dentro daquilo que pode ser feito sem invadir o espaço do outro.

Segue, então, buscando maneiras de continuar e avançar.

– Dá para fazer muita coisa disponibilizando aquilo que você aprendeu a vida toda. A gente acumula muita coisa. Basta perceber isso e voltar para a população em forma de ações.

A música que mais gosta de tocar não é feita em solo, mas em coletividade.

 

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1 Comentário

  1. Heloisa Affonseca

    Oi, como saber o nome todo de Jorge e quando haverá evento na praça ?

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