Essa história foi narrada pela jornalista Rosana Zaidan. Aperte o play para ouvi-la:
Neide é, por si só, uma lição. Lenço na cabeça, vestido estampado, brinco de argola, pulseiras douradas, anéis de pedra. A luta pela identidade africana é escancarada. Como ela faz questão que seja.
– Lutar contra o preconceito é um trabalho árduo e não se pode desistir. Quando você pensa que melhorou, percebe que tem muito trabalho a ser feito.
Fundou o Centro Cultural Orùnmilá em Ribeirão Preto há 32 anos e, desde então, defende não só a religião africana, mas tudo o que diz respeito ao ser negro.
O centro oferece oficinas culturais para crianças da periferia, atividades para os adultos, celebra os rituais africanos à risca e todo ano, há duas décadas, coloca o Afoxé na rua nos dias de Carnaval.
Tem tantos frequentadores, que Neide diz não saber o número certo. Só no Carnaval, juntam 300 pessoas.
Mãe Neide, como é chamada, não tem medo de brigar com o poder público pelo que é direito e, para isso, integrou o Conselho Municipal da Defesa da Mulher representando a mulher negra, manifestou quando foi preciso e continua a manifestar.
Aos 74 anos, tem poucas rugas e nenhum cansaço.
– É gostar da vida, sabe? Tomar muita água, nunca negar um ‘bom dia’, estar preparado para tudo e agradecer por ter saúde.
A menina Neide foi criada por mãe negra e padrasto alemão. Fez piano, frequentava às missas na igreja católica.
Aos seis anos, começou a ter desmaios que nenhum médico conseguia explicar. A mãe foi buscar explicação na religião. Neide diz ter entendido ali que deveria seguir pela religião africana.
– Eu descobri que nasci para ser mãe de santo.
Conta que, através da religião, entendeu também que era preciso lutar pela sua identidade como um todo.
Sentiu o preconceito bem cedo, dia-a-dia. O professor corrigiu seu trabalho de matemática, perguntou se a amiga japonesa era quem tinha feito e Neide passou a questionar.
– O que ele queria dizer? Eu não tinha capacidade? Fui percebendo que era preciso buscar igualdade.
Já adulta, a vontade de ter o seu lugar era latente. O marido era de Ribeirão Preto e eles decidiram que aqui seria o lugar para criar as três filhas e semear a conscientização.
Escolheram a periferia, quase à beira da Via Norte, poucas quadras da favela que se forma no final da avenida. Mãe Neide conta que a região era mato e terra vermelha.
– Lembro de ter passado por aqui e pensado: Imagine quem vier morar aqui, coitado! E foi aqui que eu vim parar. Foi aqui que meu coração bateu.
Sem apoio do poder público, mãe Neide já teve que vender o próprio carro para colocar o Afoxé na rua nos dias de Carnaval. Neste ano, o grupo saiu com roupas recicladas dos anos passados.
Ela relembra o ano em que levaram uma “faixa social”, em suas palavras, que dava o recado: “Tudo que está aí, vem daqui”.
– O Carnaval é uma forma de colocar a cultura e o povo na rua.
Neste ano, o desfile foi no sábado, em frente ao centro, com união de forças.
Neide tem um tantão de planos para o futuro. Pensa que, ao mesmo tempo em que há progressos, há retrocessos abissais.
– O momento é de reflexão em todos os sentidos. É só abrir a janela que a gente percebe. As coisas precisam mudar e as pessoas estão mudando. Sou muito positiva e sempre acho que vai melhorar.
Assim como acredita nas pessoas e no dia em que cada um vai respeitar o espaço do outro. Como ela busca fazer.
– Todo mundo tem direito de viver da sua maneira, sem preconceitos, sendo feliz.
Gosta da vida. Já disse lá em cima, para explicar suas poucas rugas e nenhum cansaço. Mas, entre tudo, tem sua fascinação.
– Sempre gostei de gente. De olhar as pessoas no olho, conversar. Criança, adulto, adolescente: tenho comunicação com qualquer um deles.
Mãe Neide é, por si só, uma lição.
Lindo!! Adorei conhecer!!
Mae Neide, mulher linda, forte, guerreira, puro ase! Uma oportunidade imensa ser filha de santo dela! Tenho por ela muita admiraçao e carinho! Adorei a matéria! E as fotos dessa mulher linda!!!!