Texto: Daniela Penha – Fotos: Tatiane Silvestroni – Ilustração: Cordeiro de Sá – Produção: Vandreza Freiria
– Nunca é tarde demais para voltar a estudar!
Antes, Gileuza não tinha essa certeza. Chegou a duvidar que seria possível.
– Eu achava que não iria voltar, não. Mas aqui eu via pessoas com mais de 60 anos fazendo estágio. Percebi que para estudar não tem idade!
Para ser realidade, o sonho, que antes era só seu, foi semeado em conjunto.
O exemplo do estagiário de 65 anos, a torcida da colega de trabalho, a amiga que fez a inscrição. De nada adiantaria tanta equipe, porém. Sem a força de Gileuza, talvez a história tivesse acabado lá atrás, na exaustão da roça, nos dias que pareciam sem fim.
Começar a jornada às 5h da manhã certa de que o descanso só chegaria após as 23h exigia altas doses de perseverança.
Gileuza Rodrigues Rocha, 49 anos, mulher nordestina, carrega a força no DNA da avó que sempre tinha espaço para mais um neto, da mãe que trabalhava duro na roça: gerações de mulheres fortes sim, senhora!
– Sair do nordeste com essa garra e coragem para chegar onde eu estou… eu me sinto realizada…
Aos seis anos, ela já trabalhava na roça. Na adolescência, somava as plantações com o trabalho em uma escola, e os estudos. O ônibus que a levava para estudar demorava uma hora e meia para ir e o mesmo na volta. Três horas de trajeto. Ela persistia.
– Eu sempre sonhei em me formar professora.
A vida deu muitas voltas antes de entregar o sonho.
Deixou a escola na adolescência, se casou, mudou para São Paulo com o marido e dois filhos crianças, sem saber o que iria encontrar. Chegou na Cáritas Diocesana de Jundiaí há duas décadas e, então, encontrou mais que um espaço de trabalho.
Entrou na faculdade de Pedagogia em 2017, aos 45 anos.
– Eu aprendi muito. Estar aqui me encorajou para coisas que antes eu não tinha coragem de fazer.
A jornada diária de Gileuza começa cheia de otimismo. Antes de iniciar o trabalho, ela segue o ritual que começou lá atrás.
– Meu Deus, hoje é um novo dia. Vamos que vai dar tudo certo!
Só se sonha com fé. Essa, sim, é uma certeza que sempre teve.
– Quem é acostumado com a roça trabalha pesado e dorme pouco tempo.
Arar a terra com bois, apanhar feijão com máquina, capinar o mato com enxada. Bem pequena, Gileuza já dava conta de coisas que muito adulto penaria a fazer.
Não há nada de poético nessa força, porém. A infância da menina, lá no sertão nordestino, foi feita de muita dificuldade.
Com quase 48 mil habitantes, Santana de Ipanema é a principal cidade do sertão de Alagoas. O trabalho na roça era o sustento da família de seis irmãos: três meninas, três meninos. Todos tinham que ajudar.
A alegria da criançada era dormir na casa da avó. Moravam todos próximos. E na casa da matriarca tinha camas para todo mundo.
As jornadas começavam cedo e, quanto mais idade se somava, maiores as responsabilidades.
– Com 14 anos eu trabalhava na roça, ia para casa às 12h, passava a tarde na escola e, quando chegava em casa, ajudava a cuidar de criança. Assim foi… sempre tinha alguma coisa para fazer.
Era preciso muita vontade para continuar estudando. Os pais incentivavam e, então, Gileuza podia sonhar. Começou a trabalhar em uma escola ainda adolescente, o que fez crescer o desejo de ser professora.
– De manhã eu trabalhava na roça, à tarde na escola e à noite ia estudar. O ônibus passava às 18h e eu voltava para casa só a meia noite. No outro dia, começava tudo de novo, às 5h.
Mas a pausa ao sonho veio logo.
Como tinha que trabalhar, não conseguiu finalizar o colegial.
Se casou aos 19 anos, teve o primeiro filho aos 21, em 1993, e o segundo em seguida. Os bebês acompanhavam a mãe na roça.
– Eu amarrava a rede debaixo das árvores e eles ficavam comigo.
Em 1996, ela e o marido decidiram partir para São Paulo em busca de novas histórias.
– Arriscamos tudo!
Ele tinha um primo por aqui com a promessa era de que havia empregos e melhores chances. Vieram de ônibus. Foram três dias de viagem com duas crianças pequenas.
– Lembro como hoje. Viemos em 14 de novembro de 1996. Foi muito sofrimento… o ônibus deixava a gente na rodoviária de São Paulo.
Foram morar em Louveira, região de Jundiaí.
– Matriculei meus filhos na creche e fui logo trabalhar.
Mudaram para Jundiaí em 2002. Fazia faxina, trabalhou em empresas, não tinha parada. Ainda assim, conseguiu energia para terminar o colegial, cursando o supletivo. Era aquele sonho antigo reverberando lá dentro.
Em 2003, conheceu a Cáritas. Ficou deprimida, após o falecimento de sua mãe e uma amiga sugeriu que ela começasse aulas de pintura em tecido para se animar.
Começou colorindo panos de prato, logo se tornou voluntária e nunca mais deixou a instituição.
Em 2007, foi chamada para ser recreadora. Cuidava das crianças que acompanhavam as mães nas atividades, assim como levou seus meninos consigo tantas vezes. Foi ficando.
– Quando você faz com amor, dá certo! Nada te cansa.
Gileuza sabe tudo o que acontece na instituição. Os horários das aulas, a agenda da semana, as alegrias e aflições de quem entra e sai.
– Todo mundo chega aqui e pergunta: ‘Cadê Gileuza?”.
Fundada em 1997, a Cáritas de Jundiaí atende famílias em vulnerabilidade social com ações diversas que vão de oficinas recreativas, atividades esportivas, até assessoramento e serviços comunitários. A entidade atua no fortalecimento de vínculos, qualificação profissional, garantia de direitos, além de promover ações de mobilização do terceiro setor e fomento de políticas sociais.
Gileuza está presente nas oficinas de pintura, arte, culinária, crochê, nas atividades esportivas e nas recreações. Como orientadora social, acompanha e participa de grande parte da rotina, acolhe quem chega à entidade.
A Cáritas é cadastrada no Mesa Brasil desde maio de 2019.O programa do Sesc São Paulo constrói pontes entre empresas que podem ajudar e instituições que precisam de ajuda, realizando diariamente a coleta e distribuição de alimentos em todo estado de São Paulo (leia mais abaixo).
Até maio de 2022, três anos de parceria, a instituição já havia recebido a doação de 26,1 toneladas de alimentos. Os mantimentos são oferecidos para as famílias acolhidas, que estão diariamente na unidade.
– A gente faz lanches, sopas, bolos, sucos. Aproveita tudo o que chega. Não há desperdício.
Na pandemia, com a unidade fechada, montavam kits e doavam para mais de 100 famílias atendidas.
– Ajudou demais! O pessoal já perguntava: ‘Tem doação essa semana?’.
Na Páscoa deste ano, todo mundo ganhou ovos de chocolate.
– A gente faz questão de repartir para todos. Todo mundo ganha!
São duas décadas transformando a Cáritas em extensão de lar.
Foi em meio ao dia a dia da instituição que o sonho de Gileuza, semeado em conjunto, foi se tornando realidade.
A assistente social, colega de trabalho, foi quem fez a inscrição no curso de Pedagogia da faculdade Anhanguera.
Gileuza e o marido apertaram as contas e encontraram uma forma de arcar com as mensalidades.
– Fiz a prova, passei e comecei!
Se formou em 2021. Já pegou o diploma, mas aguarda o fim da pandemia para comemorar a conquista com festança de formatura.
Faz planos para o futuro, vai sonhando adiante.
– Quero fazer a pós-graduação voltada para idosos, estudar mais.
Agora, os sonhos são tantos que ela os divide em etapas. Alguns, que aguardam há muito, se tornaram prioridade, contagiados pela possibilidade de se tornarem reais.
– Esse eu vou realizar logo, se Deus quiser. Quero tirar minha habilitação.
Hoje, Gileuza já tem os dois filhos criados, mas a neta de nove anos mora com ela desde pequenina. Assumiu a função de deixar mais uma mulher forte para o mundo.
– É como minha filha.
O segredo do sorriso que fez morada no rosto? Ela repete:
– Quando você faz por amor, nada cansa.
Todos os dias, segue seu ritual.
– Eu chego para trabalhar e falo: Meu Deus, hoje é um novo dia. Vamos que vai dar tudo certo!
Só se sonha com fé, ela bem sabe.
Mas já depois de tanta história, somou outro aprendizado.
Sonho tem hora? Ela, então, responde, sem titubear:
– Não tem! Vá em frente e realize!
É sempre tempo: hoje é uma certeza.
Conheça mais sobre o Mesa Brasil
Que tal criarmos uma ponte entre quem precisa de ajuda para matar a fome e quem pode e quer fazer o bem? Uma ponte que consiga unir essas duas pontas, fazendo com que os alimentos que sobram para um cheguem à mesa do outro?
É isso que faz o programa Mesa Brasil, criado pelo SESC SP há 27 anos e presente em todo o país.
Caminhões coletam diariamente doações de alimentos com empresas, supermercados, cerealistas, produtores, entre outros fornecedores e entregam para instituições sociais e hospitais. Só em São Paulo são 30 caminhões circulando todos os dias para atender 95 cidades paulistas.
Realizando a coleta e a entrega dos produtos, o Sesc São Paulo facilita o caminho para quem quer doar e garante que toneladas de alimentos que seriam desperdiçados cheguem à mesa de quem precisa: uma rede de combate à fome!
Em 2021, foram 1341 instituições sociais beneficiadas, além de milhares de famílias que levam alimentos direto para suas casas. As 1191 empresas doadoras fizeram 6,4 milhões de quilos de alimentos chegarem à mesa de quem precisa.
Em Jundiaí, o programa foi implantado em maio de 2019 e já distribuiu mais de 706 toneladas de alimentos, para 44 entidades cadastradas. Ao todo, quase 9 mil pessoas foram beneficiadas pela solidariedade de 63 instituições doadoras.
O projeto “Gente que Alimenta” conta as histórias de quem faz esse programa do bem acontecer: doadores e instituições que precisam de apoio para continuarem suas atividades.
Quer saber mais sobre o Mesa Brasil? Quer se tornar um doador? Acesse o SITE AQUI e se encante ainda mais com esse bonito programa!
Conheço a Gileuza, tive oportunidade de trabalhar com ela, pessoa maravilhosa, faz um bolo de caçarola como ninguém. Parabéns pela matéria, pelo texto maravilhoso que expressa a grandeza dessa mulher. A Caritas é um espaço de grandes histórias.
É com muita alegria no meu coração que falo dessa guerreira. Gileuza para muitos, mas Gileuzinha para mim. Eu posso falar do quanto a Gileuzinha é forte, determinada e amiga. Afinal foram quase sete anos trabalhando juntas, todos os dias. Parabéns Gileuzinha! Você é uma vitoriosa. Deus continue te abençoando sempre. Que orgulho poder falar de você, das suas vitórias.
Gileuza , um exemplo de mulher! Carinhosa no trato com as pessoas , cheia de amor no coração , meus Parabéns !! Você é merecedora dessa conquista que dela venha colher muitos frutos, Sucesso !! ???
A Gileuza é uma mulher inspiradora, guerreira e sem medo de enfrentar os desafios do cotidiano. Tenho orgulho dessa pessoa que tive o grande prazer de conhecer e tornou-se minha amiga que carrego com grande estima no coração ?
Que orgulho dessa brasileira que ao invés de ficar reclamando com a ajuda de Deus e a sua determinação mudou o rumo de sua vida Parabéns ???
Parabéns Gileuza, nunca é tarde para realizar os sonhos. Sempre em frente amiga, merecedora de todas as conquistas, muito sucesso na sua vida!!!
Parabéns prima Gileuza!
Sua história é a história de muitas mulheres nordestinas.
Só que com um diferencial, vc é guerreirinha, mulher de uma fé inabalável, espírito de humildade elevado,dentre outros adjetivos.
Tenho muito orgulho de vc, a emoção tomou conta de mim, uma verdadeira retrospectiva de décadas veio a tona. Avante.
“Não existe conquistas sem lutas”.
Te Amo Mãe Desejo Todo Sucesso Do Mundo Pra Senhora. Que Deus Continue Te Abençoado Muito Você Merece De Mais
Bom eu cheguei no Cáritas do novo Horizonte lá conheço essa guerreira uma mulher forte minha nossa que força tem quando está de férias muitas vezes Eu liguei pra ela até me esqueci que estava de férias mesmo assim de longe sempre atendida agente depois Eu pedia desculpas pois me esqueci que estava de férias mas sempre com carinho disposta atender vai fazer muita falta.mais nunca desistiu de seu sonho e sempre é encentivo pra todas nós muito obrigado por ter te conhecido mais sei que seu coração está na Cáritas amiga Eu amo muito vc voa amiga