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Dady mora no interior da Bahia. Mandou uma mensagem dizendo que fazia questão de contar a trajetória que escreveu com Sandra, que mora aqui em Pirassununga, há milhares de quilômetros. “Quero muito contar essa história”, enfatizou.
São amigas, eu perguntei? E ela foi explicando que escolheram nomear esse laço de outra forma. “Ela é minha família”, nas palavras de Dady. “Deus me deu uma irmã”, Sandra contou. Família é também quem a gente escolhe para seguir junto, foram ensinando. Depende das doses de carinho e cumplicidade: o que têm de tanta sobra que dá até para emprestar.
As duas não se conheciam quando Sandra Maria Marques tomou a decisão de acolher Solidade da Glória dos Santos, a Dady, e seu filho, Dadison, em sua casa, cinco anos atrás.
Os dois vivem no interior da Bahia, cidade chamada Taperoá, e precisavam de um lugar próximo de Ribeirão Preto para ficar enquanto o menino estivesse em tratamento no Hospital das Clínicas.
Dadison tem epilepsia e lá na Bahia não havia o tratamento que ele precisava para ficar bem. Chegava a ter 20 ataques epiléticos em um único dia. A mãe conta que a previsão dos médicos era de que seu filho teria sequelas graves: cegueira, surdez, limitação dos movimentos. Foram encaminhados para Ribeirão para que tivessem tratamento melhor.
Família simples, que vive de muito trabalho, não tinham como se alojar em outra cidade e arcar com esses custos. Aí entra a tal cumplicidade que transforma gente distante em família.
Sandra e Dady, que nunca haviam sequer se falado, tinham uma amiga em comum, além de uma amizade entre o pai de uma e o sogro da outra.
– Meu pai ligou dizendo que essa família precisava de ajuda. Eu perguntei ao meu marido o que ele achava e ele me respondeu: ‘Faça o que estiver no seu coração’.
Já se passaram cinco anos e Sandra se emociona para contar. O choro sai fácil.
– É uma história triste e emocionante ao mesmo tempo.
Na foto estão Sandra, Dady, Dadison, o marido de Dady e uma sobrinha
Sandra e Dady, ainda que nunca tivessem se falado, compartilhavam dores e alegrias.
Antes de vir morar em Pirassununga, região de Ribeirão Preto, Sandra, 47 anos, viveu na mesma cidade de Dady, 32. Foi lá que ela nasceu e cresceu. Sua família, assim como a de Dady, se mantinha com agricultura. Sua mãe fazia farinha de mandioca, azeite de dendê, colhia cravos, vivia da terra, como vive ainda hoje Dady e seu marido.
Na força do trabalho, as duas cresceram.
– Minha mãe era batalhadeira. Trabalhava muito para sustentar a gente. Criou a gente sempre ensinando o caminho do bem.
Conta Sandra. Eram em 10 irmãos em casa. Todos puderam estudar, com o incentivo e a garra dos pais. Ela deixou a Bahia aos 20 anos, depois de uma decepção amorosa. Comprou briga com toda a família por um namorado que sumiu no dia do noivado. Decidiu, então, partir, em busca de novos ares. Escolheu morar com uma prima, em Pirassununga.
Na nova cidade, conheceu o marido, com quem divide a vida há décadas. Os dois tiveram três filhos. O primeiro faleceu quatro horas depois do nascimento. Sandra conta que houve um erro médico na hora do parto, feito tardiamente. Além da morte do filho, teve uma infecção generalizada gravíssima, que lhe deixou na cama por dias a fio.
– Eu não pude enterrar meu filho.
Na recuperação, contou com a ajuda do marido, do seu irmão caçula e de uma vizinha, que escolheu para batizar seu segundo filho. Ele nasceu prematuro, ficou 17 internado para a agonia da mãe. Hoje, é história. Sandra faz questão de mostrar o jovem, 22 anos, na chamada de vídeo.
– Olha aqui minha vitória! Essa é a história da nossa vida!
Teve mais um filho, que hoje está com 19 anos. Mostra o caçula no vídeo também: mãe que ama e se orgulha.
Quando seu pai ligou dizendo de uma mãe que precisava de ajuda para tratar o filho, Sandra sentiu o peito apertar. Sabia bem de que dor ele estava falando.
– Mexeu muito comigo. Foi muito forte. Eu posso me arrepender um dia do que não tentei, mas nunca do que fiz. Eu ensino isso para meus filhos.
Sandra, o marido e os dois filhos
Sandra pegou o telefone de Dady com seu pai e telefonou para ela. Do outro lado da linha, mais emoção.
– Eu gelei. E ela disse: ‘Eu te oferto minha casa’. E eu disse: ‘Tá feito! Eu vou!’.
Dady cresceu na Bahia, onde mora ainda hoje. Vive da terra, mas sonhou em ser professora. Fez o magistério e chegou a começar a faculdade de Letras. Foi na mesma época em que a doença do filho se complicou e o tratamento em Ribeirão se fez necessário.
– Tive que parar. Não podia deixar meu filho só.
Depois da conversa com Sandra, decidiu aceitar a ajuda. Veio, mas continuou apreensiva. Dadison não parava um só minuto, como toda criança de 5 anos. As crises epiléticas, agravavam a rotina. Uma tarde, Sandra chamou Dady para conversar.
– Eu já fui dizendo: ‘O que foi que eu fiz’. E ela me acalmou. Percebeu que eu tinha ficado com vergonha porque o Dadison não parava quieto e disse: ‘Fica tranquila, Dady. É criança. A casa é tua’.
Dady e Dadison foram acolhidos por Sandra, o marido e os dois filhos durante os três meses de tratamento. O marido dela ficou na Bahia, com o outro filho. As famílias se multiplicaram. Hoje, é tio para lá, tia para cá.
Mais do que acolher, Sandra se desdobrava no trabalho de cozinheira em escola pública para acompanhar Dady às consultas no Hospital das Clínicas de Ribeirão.
Quando a mãe soube que, para melhorar, o filho deveria passar por uma cirurgia de risco, a amiga estava lá, junto, segurando a mão, dando apoio.
– Os médicos falaram tudo para a gente: o que podia acontecer.
Dady decidiu tentar. Dadison passou pelo procedimento no dia 18 de junho de 2015. Hoje, aos 11 anos, esbanja alegria.
– Até hoje ele está perfeito. Não teve mais uma crise. Quem vê meu filho não imagina tudo o que ele passou. Deus foi muito bom com a gente.
Dady, seus filhos e o marido na casa onde vivem, na Bahia
Agora, mãe e filho voltam para Ribeirão Preto uma vez por ano, para exames de acompanhamento. Vêm com auxílio do Governo da Bahia e ficam apenas o tempo da consulta: dois dias, em média. Não há uma vinda em que não passem na casa de Sandra para um beijo.
A amiga também fez questão de ir visitar a família estendida. E o contato não fica só presencial. As duas se falam quase todo dia, em chamada de vídeo, voz. “Ela sabe se eu estou triste e eu sei quando ela está”, é Dady quem conta. “A gente desabafa. Falo para ela coisas que não conto para ninguém”, é a vez de Sandra.
A sincronia está em cada palavra.
Dady não esconde a admiração que tem pela amiga, de coração gigante.
– Ela está sempre ajudando!
Sandra fez questão de ajudar outra família que saiu da Bahia com o mesmo desafio de Dady e Dadison. Eles estavam em uma kitnet. Ela fez uma rifa, arrecadou fundos e levou, para que tivessem como se manter por um tempo.
Atualmente, pela pandemia da Covid-19, montou um grupo de amigos para arrecadar mantimentos e doar às famílias que estão precisando. Solidariedade, ela diz, é herança de mãe.
– Minha mãe tirava da boca dela para dar a outra pessoa. Meu pai falava: ‘Qual vai ser a caridade de hoje?’. Eu quero sempre levar isso para meus filhos.
Sua mãe faleceu 15 anos atrás. Sandra estava no ônibus, a caminho da Bahia, para visitá-la. Não conseguiu chegar a tempo. Chora ao contar. A saudade nunca passa. Transforma suas dores em amor, porém.
– Vamos viver o hoje, porque amanhã a Deus pertence. Fale hoje que ama, abrace hoje, porque a vida é um sopro. Eu tenho essa força de minha família.
A próxima consulta de Dadison está marcada para junho. Se a pandemia do coronavírus deixar, a família estará unida de novo. Dady e Sandra já estão ansiosas.
– Gratidão é muito pouco. O que eu sinto por ela é um carinho tão grande que eu nem sei como explicar.
Dady fala de Sandra e a amiga retribui:
– É amor, amor, amor. Uma pessoa que eu nunca tinha visto se mostrou uma amiga fiel de verdade. Só tenho a agradecer a Deus por ter colocado ela na minha vida.
Dady mandou uma mensagem dizendo que fazia questão de contar a história que escreveu com Sandra, como forma de gratidão. Depois de tudo, sou eu quem agradeço. Quanto amor as duas compartilharam para que eu transformasse em palavras!
Família é também quem a gente escolhe para seguir junto.
Fotos: arquivo pessoal
Meu Deus e muito forte essa história.
Tudo isso só foi possível através de uma palavra chamada amor pelo próximo.
Que Deus abençoe cada família.
Essa história da para escrever um livro, com um lindo final feliz.
Deus tem um propósito na vida de cada um de nós.
Pois assim em me pergunto qual o verdadeiro sentido da vida?.
Vivemos a esse mundo só para viver se preocupando com nossa família ???.
E o próximo e pessoas que muitas das vezes passam por nós com um pedido de socorro preso na garganta e muitas das vezes não enxergamos pois estamos muito preocupadas com nós mesmos .
Agradeço a Deus por essa mulher de fibra que Deus usou para acolher a outra mulher gerreira.
Que Deus continue abençoando cada família.
Linda história q Deus ti abençoe sempre