Esta história foi narrada pela jornalista Daniela Penha. Para ouvi-la, é só clicar no play:
Vale a pena ler de novo! História publicada pela primeira vez em 23 de agosto de 2017.
A força que faz Carmem continuar vem de seres com menos de um quilo.
A maioria já chega ao mundo sem expectativas médicas. “As chances de o bebê sobreviver quase não existem”: quantas vezes Carmem escutou!
Escuta e não põe fé.
Impossível desmanchar ideia construída em mais de 30 anos de enfermagem no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, 17 deles como enfermeira na UTI neonatal:
– Enquanto o coração estiver batendo, há esperança.
Carmem Lúcia Santana Oliveira acredita. E dá a esses bebês prematuros identidade feita de tecido e linha.
Para ela, a primeira roupinha de muitas que eles hão de vestir.
A ideia surgiu em meio à rotina, 17 anos atrás.
Na maioria das UTIs neonatais os bebês que nascem em prematuridade extrema – menos de 28 semanas de gestação – vestem só a fraldinha.
– Nenhuma loja vende roupas para um recém-nascido tão pequeno. Nós temos bebês com 500, 600 gramas! Até roupa de boneca fica grande!
Carmem nunca havia costurado na vida. Pediu ajuda para a família, foi aprendendo aqui-ali e a primeira roupinha saiu.
Começou as entregas. No início, quando ainda trabalhava na UTI neonatal, levava uma roupinha sempre que um bebê novo chegava.
Depois, passou a fazer entregas semanais. Não fica mais de duas semanas sem aparecer com as peças, que já vão lavadas e passadas: prontas para usar.
Perdeu as contas de quantas roupinhas entregou. Faz uma soma rápida e conclui que, certamente, mais de cinco mil peças.
– O melhor de tudo é a mãe. Quando a mãe encontra a criança com roupa, não sabe se chora ou se ri. É lindo demais. Eu queria que você visse a carinha delas!
A lista de bebês que chama de seus é grande.
Ela vai contando as histórias de crianças que hoje exibem seus 10, 12, 17 anos, cheias de saúde; daquelas que participou dos batizados, da festa do primeiro aninho.
– Outro dia, uma mãe me chamou no corredor e me deu um abraço gostoso. Disse que queria me agradecer pela roupinha que eu deixei para o bebê dela.
Os pais, ela diz cheia de orgulho, guardam aquela roupinha minúscula como lembrança da força imensa que habita gente tão miúda.
– Eles mostram a roupa para as pessoas saberem que não é imaginação. O bebê era mesmo daquele tamanho.
Em todo esse tempo, Carmem nunca vendeu uma só peça – apesar de receber um tantão de pedidos.
– Tem preço que pague a alegria dessa mãe? Não tem preço que pague!
Carmem decidiu que queria ser enfermeira aos seis anos.
A irmã sofreu um acidente e ela pôde conhecer a rotina daquelas que mudam o canal da TV, fazem curativo que “não vai doer”, cuidam das medicações e atuam como conselheiras.
O primeiro emprego foi no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, de onde não mais saiu. Ficou 17 anos na UTI neonatal e, há quase três anos, foi transferida para o setor de neurologia.
Não fica longe dos “seus bebês”, porém. Dá um pulinho no setor neonatal sempre que sobra um tempinho, e aproveita para checar quem precisa de roupinha.
Estoque não pode faltar! Mesmo para os bebês maiores, tem sempre uma peça. Mas frisa:
– Minha especialidade é menos de um quilo.
Até quando “Deus der força” ela garante que vai continuar espalhando o bem.
– A vida? A vida é tudo! Tem que aproveitar cada segundo. A gente vem nu e, se ninguém põe roupa, vamos embora nus também.
Carmem vai continuar vestindo bebês de linha, tecido e amor.
– Eles são milagrinhos de Deus.
Sabe que a força encontra morada em gente miúda. E – que bom! – não há o que a faça mudar de ideia!
Sobre histórias que a gente precisa (re)contar
É a terceira vez que conto a história de Carmem. A conheci três anos atrás, quando trabalhava no Jornal A Cidade. A primeira reportagem saiu no jornal impresso em 2014 e dois anos depois contei sua história no blog que tive pelo portal A Cidade ON.
Já contei centenas de histórias (150 delas aqui no História do Dia). Todo mundo tem uma história e toda história tem sua importância!
Carmem é uma das que mais me emociona e inspira. Vale a pena ser contada quantas vezes for, porque é toda feita de bondade e amor.
Espalhar o bem: é o que nos move! É o que move Carmem!
*Quer traduzir essa história em libras? Acesse o site VLibras, que faz esse serviço gratuitamente: https://vlibras.gov.br/
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Nos ajude a continuar contando histórias!
Belo trabalho da Carmen! Inspirador.