João garapeiro é história de pai para filho

3 setembro 2019 | Gente que inspira, Histórias do Proac 2019/2020, Parte da gente

Esta história foi narrada por Antônio Carlos Coelho, a “voz da Feira do Livro de Ribeirão Preto. Para ouvi-la, é só clicar no play: 

 

Vale a pena ler de novo! História publicada pela primeira vez em 6 de março de 2017!

 

Colada em um espelho no alto da garapeira, está a foto de João José Perone com a frase: “Morre o homem fica o nome”. Na lateral da Kombi, uma placa da rua com o nome que ficou. João Garapeiro Filho dá continuidade ao trabalho que o pai começou 62 anos atrás.

Faz questão de atender cada cliente que chega. O sorriso é marca registrada. Só não mais que o gosto da garapa: ele processa a cana na hora e bate no liquidificador com gelo e frutas – abacaxi ou limão, no paladar do cliente.

Ninguém sai de lá sem tomar um copinho.

– Meu pai era assim. Todo mundo tomava uma garapinha, com dinheiro ou sem.

Também era costume do João pai segurar o copo com o dedinho levantado e esbanjar brincadeiras, tentando deixar mais leve a rotina de quem passa pelo Centro de Ribeirão Preto. “Ô linda! Fala tchau para o João! Não pode ir embora sem falar tchau”, agora é o João Filho quem brinca.

–  Até hoje eu tento imitar meu pai. Igualar nunca, porque ele era ímpar.

A História do João Garapeiro é de pai para filho.

João Filho conta que seu pai abriu a garapeira em 1955, aos 35 anos, depois de muito trabalhar como caixeiro, vendedor, entregador de mercadoria.

Estacionou seu Fordinho 1929 em frente a agência dos Correios, na Américo Brasiliense. Em 1975, um estacionamento obrigou a mudança da garapeira para a rua Álvares Cabral.

Foi nesse mesmo ano que João Filho e a esposa começaram a trabalhar com o pai, que já estava com 55 anos e se dizia cansado.

– O meu pai me disse: ‘Filho, na garapeira você não vai ficar rico, mas vai ter uma vida confortável’.

João Filho estava com 20 anos e trabalhava no setor de compras de uma grande empresa. Deixou tudo e assumiu a garapeira ao lado da esposa. Criaram os dois filhos com o trabalho na cana.

O pai morreu em 1996, aos 76 anos e cedo demais para os filhos e os tantos clientes.

– Ninguém esperava por essa notícia na cidade.

Foi homenageado com um título de cidadão ribeirão-pretano, uma rua e uma praça com o seu nome no Jardim Botânico. Tudo história. A rua João Perone no passado era a fazenda onde o garapeiro buscava a cana.

O homem se foi. O nome ficou.

Há quatro anos, o João Garapeiro precisou mudar de endereço por determinação da prefeitura. Agora, fica na rua São Sebastião com a Álvares Cabral.

O tempo trouxe outras tantas mudanças – boas e ruins.

A cana que o pai tinha que buscar, limpar e cortar hoje já vem prontinha. O Centro, que era área nobre da cidade, hoje é descuido para João.

– O Centro acabou. Não existem mais as raízes, aquele calor humano. Não temos banheiro público, um bebedouro…

A garapa continua querida por ribeirão-pretanos e turistas. João vende, em média, 25 litros da bebida de cana por dia. Mas avisa:

– Hoje eu não prezo por ganhos, mas por qualidade e bom atendimento. O ser humano está pensando mais em ter do que em ser.

Toda quinta-feira, tira folga, para compensar o sábado que é dia de muito trabalho.

– Vem gente de toda a região para tomar garapa. Eu me sinto um anfitrião na minha cidade.

João Filho continua o legado do pai, com a certeza que já testemunhou: “Morre o homem, fica o nome”.

João Garapeiro, parte da história de Ribeirão Preto, já ficou.

 

*Quer traduzir essa história em libras? Acesse o site VLibras, que faz esse serviço gratuitamente: https://vlibras.gov.br/

 

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