Daniela Penha
A noite do dia 2 de setembro de 2018 também entrou para a história do Brasil. Que tragédia: a história marcada pelo seu próprio apagamento.
As imagens do Museu Nacional do Rio de Janeiro em chamas passam a constituir a memória do povo brasileiro. Memória em cinzas. Capítulo feito de paradoxo: que povo quer a memória apagada como parte da história?
Mas a história é assim: acontece. Aqui, agora, em cada cantinho do país há história em movimento. História não pede licença para acontecer. Mas dá avisos. O sucateamento da instituição foi alardeado pelos seus administradores em maio, às vésperas da comemoração de 200 anos do maior museu de História Natural da América Latina.
Vinculado a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), há tempos o museu não recebia os repasses necessários para sua manutenção. O último presidente que pisou no local foi Juscelino Kubitschek, em 1958 (!), de acordo com os registros fotográficos do próprio museu.
Na celebração de seus 200 anos, o Museu Nacional assinou com o BNDES um contrato de patrocínio no valor de R$ 21,7 milhões, que deveria ser destinado para sua recuperação. Não deu tempo. Os anos de sucateamento tiveram mais força.
O Brasil é um país que não preserva sua memória: constatação replicável em âmbito de governos federal, estadual e municipal. Ribeirão Preto, com museus fechados e acervos sem previsão de inauguração, não fica de fora. Quais iniciativas públicas de preservação da memória estão sendo executadas? Como a nossa memória está sendo preservada?
A função é abraçada pelos próprios cidadãos, que preservam a identidade em ações e projetos mantidos com muita força de vontade.
Um país que não preserva sua história corre riscos graves de perder-se de sua identidade. De transformar-se em um país sem alma.
Neste domingo, uma parte de nossa identidade virou cinzas.
Eu me lembro de aprender na escola sobre o fóssil de Luzia, o esqueleto mais antigo já encontrado nas Américas e que mudou as teorias sobre o povoamento da nossa terra. Era considerado um dos maiores tesouros do museu. Hoje, é apagamento. Como outros tantos objetos que continham história. O acervo do Museu Nacional era feito por cerca de 20 milhões de itens. Pesquisadores tentam resgatar miudezas das cinzas.
O acervo foi consumido pelo fogo: não há como apagar essa parte da história. Havia como tentar impedi-la. Que sirva, ao menos, como lição. Dessas bem amargas.
Que a gente possa aprender com a tragédia que marcou o apagamento da nossa história. Um povo sem história é um povo sem direção.
Crédito da foto: Agência Brasil/Tânia Rêgo
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